segunda-feira, 18 de junho de 2007

Seu boiadeiro, por ali choveu

Foram dois dias de arromba os que se viveram por Viseu neste último fim-de-semana. As condições metereológicas adversas, ainda que não tenha chovido na sexta-feira, obrigaram a que os espectáculos se centrassem quase todos no pequeno teatro Viriato, impedindo que a festa chegasse a um número mais alargado de pessoas e em espaços mais dignos para o que ali se pôde ouvir. Tirando algumas falhas da organização, tirando o excesso de rigor (para não dizer palermice) de um ou dois funcionários dos corredores do teatro, este fim-de-semana de arromba serviu de óptimo augúrio para futuras edições deste festival.

Podia não haver muitos nomes em cartaz -- afinal de contas, este foi o número zero, como dizia a organização -- mas houve seguramente um alto concentrado de qualidade. A começar logo pelo concerto de sexta-feira do Cordel do Fogo Encantado. Depois da apresentação no castelo de Sines, no ano passado, o Cordel mostrava-se agora com novo álbum perante uma plateia de umas poucas centenas de pessoas (não dava para mais). Espectáculo íntimo, portanto. E avassalador. Durante pouco mais de hora e meia as (muitas) percussões do grupo estiveram em constante diálogo com a estrutura do renovado Teatro Viriato. E o público sentado ali, no meio, a assistir aos argumentos. Se os Mão Morta não tivessem nascido em Braga, mas sim em Pernambuco, na pequena cidade de Arco Verde, talvez tivessem sido como o Cordel. E se Adolfo Lúxuria Canibal não crescesse a ler Lautréamont ou outros autores malditos e tivesse os poemas de cordel do interior brasileiro na mesinha de cabeceira, talvez tivesse sido Lirinha, figura epicêntrica deste abalo de terras que dá pelo nome de Cordel do Fogo Encantado. Foi melhor que em Sines? Foi sim, embora não consiga sequer explicar como é que isso ainda pôde ser possível. Para o resto da noite ainda houve a sessão Mais Valor, com a velha guarda de Viseu a homenagear o falecido José Valor (Bastardos do Cardeal, Lucretia Divina, Centro de Pesquisas Ruído Branco, Major Alvega, etc.) no foyer do teatro, e a dupla lisboeta Dezperados, pela noite fora na discoteca NB.

No sábado, veio a chuva, mas a festa continuou. Logo com os impagáveis Anonomina Nuvolari, que, sem qualquer amplificação, semearam a boa disposição no teatrinho do Clube de Viseu, um antigo (e belíssimo) salão aristocrático daquela cidade, com o seu reportório de música italiana ligeira em formato festarola. Irrequietos como sempre, e em total contraste com a plateia de todas as idades que se sentava nas cadeiras de madeira do salão, os italianos tocaram em cima do palco, à frente do mesmo, atrás das cadeiras, à volta do público, por entre o público, pelas outras salas, enfim. E tão bom que foi ouvir o "Bella Ciao" na capital do Cavaquistão... Mais perto da hora de jantar, os lisboetas Nobody's Bizness apresentaram no palco do teatro a sua versão dos blues acústicos norte-americanos. A voz da Petra e a guitarra do Luís estão cada vez melhores (e juro que não me pagam para dizer isto, embora não tenha nenhum problema se o quiserem passar a fazer, ok?). Para a noite, mais de duas dezenas de pessoas em palco, com o colectivo Mountain Tale, que agrupava as vozes penetrantes das mulheres búlgaras do grupo Angelité, os sempre surpreendentes cantos guturais e instrumentos rudimentares dos Huun-Huur-Tur, da república de Tuva, e os maestros de toda esta gente, o grupo de jazz experimental Moscow Art Trio. Se alguém tem dúvidas de que isto se possa combinar de forma eficiente, é porque não esteve no Teatro Viriato. É de se sair com o coração nas mãos. A noite continuou depois com os badamecos do Bailarico Sofisticado até às quatro e tal da manhã, no foyer do teatro, sem baixas, sem mortes, a não ser a do sistema de som que saiu dali bastante maltratado (caso para fazer uma piadola apropriada: deu "barraca o som sistema"). Um dia destes, deixo aqui fotografias deste fim-de-semana.

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