quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Pessoas, animai-vos porque vem aí mais um Barreiro Rocks!


Mais uma interrupção no silêncio que paira por estas bandas, e reparai quão bem justificada se torna a interrupção, para anunciar o cartaz de mais uma edição, a 15ª, do Barreiro Rocks. Este ano, decorre no fim de semana de 4 a 6 de dezembro e tem por palcos o sempre obrigatório e mui nobre Clube dos Ferroviários (inclui também o palco da festa pela madrugada fora, o palco #partyfiesta) e agora também a antiga Escola Conde de Ferreira (onde se encontra instalado o Centro de Produção e Participação Artística do Barreiro) e a ADAO (Associação Desenvolvimento Artes e Ofícios).

E quem é que lá vai tocar? Os Parkinsons, que voltam depois de estourarem com tudo em 2002, ou os ingleses Baron 4 ou os japoneses The Routes, só para dar alguns exemplos do cartaz. E Sunflowers e D3Ö! E Tiger Picnic! E, porque afinal é o Barreiro Rocks, não podiam faltar os espanhóis Los Chicos, os mexico-marcianos Los Santeros, o português do delta Fast Eddie Nelson e, acabadinho de casar, o norte-americano das rodelas de sete polegadas, o DJ Shimmy. Mas há muito mais, como se poderá ver mais abaixo. Os bilhetes custam 30 euros para os três dias ou, em alternativa, 15, 20 ou 10 para sexta, sábado ou domingo, respetivamente.

PROGRAMA:

4 de dezembro

Palco Ferroviários
22h Cave Story
23h D3Ö
00h The Baron 4 (Inglaterra)
01h The Routes (Japão)

Palco #PARTYFIESTA
02h The Sunflowers
DJ SHIMMY (EUA)

5 de Dezembro

Palco Escola
16h Postcards From Wonderland
16h45 800 Gondomar
17h30 The Brooms
18h15 Fabuloso Combo Espectro (Espanha)

Palco Ferroviários
21h30 The Jay Vons (EUA)
22h20 The Government (Espanha)
23h10 Fast Eddie Nelson
00h Los Chicos (Espanha)
01h The Parkinsons

Palco #PARTYFIESTA
02h Clementine
DJ SHIMMY (EUA)

6 de Dezembro

Palco ESCOLA
16h00 Planeta Quadrado
16h45 Tiger Picnic
17h30 Conan Castro & The Moonshine Piñatas
18h15 Mighty Sands
19h Los Santeros (México)

Palco ADAO
22h Calcutá
23h Vaiapraia & As Rainhas do Baile
00h DJ Set #PARTYFIESTA

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Anominous

Breve interrupção na ausência de animação por estas bandas só para avisar que os Pop Dell'Arte tem tema novo e isso é, claro, acontecimento. Olhai o teledisco acabadinho de estrear:

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Em 2015 e ainda falamos em Músicas do Mundo? Siga!

Não é todos os dias que temos a música a ser discutida nas páginas de jornais de distribuição alargada por gente com autoridade como António Pinto Ribeiro, que ontem assinava um texto de opinião no jornal Público intitulado "Músicas do mundo ou músicas de fora da Europa?". Pinto Ribeiro foi diretor do excelente Próximo Futuro, um programa de música ao vivo da Gulbenkian, fundação na qual agora assume um papel mais abrangente, com a coordenação do Museu, do CAM e do Serviço de Música. Sabe do que fala e o texto tem que ser lido por todos os que se interessam pelas mais dversas facetas da produção musical numa perspetiva globalizada.

Mas, como todos os bons textos, merece também ser discutido.

Como ponto de partida, será que a discussão em torno da utilização do termo "world music" ou "músicas do mundo" é hoje tão pertinente quanto o era em 1999, ano em que David Byrne publicou no New York Times o famoso texto "I Hate World Music", citado por Pinto Ribeiro? Não é verdade que então se usava muito mais vezes o termo para se dividir águas e subalternizar algumas músicas em relação a outras, tivesse esta separação lugar nos escaparates das lojas de discos, nas playlists das rádios ou na produção de concertos e festivais? Em Portugal, isso era claro: as músicas "normais" de um lado, para as pessoas com gostos normais, e as músicas do mundo, do outro. Para as pessoas com gostos estranhos. Talvez sofisticados, mas estranhos.

Todavia, em quinze ou mais anos, o panorama mudou muito. Talvez por causa de um fenómeno mais alargado de globalização cultural, talvez por causa de feiras como a Womex, talvez por causa dos Rough Guides da World Music Network (Nome profano! E o site? worldmusic.net? Para a fogueira com eles!), talvez por causa da união dos agentes, das editoras e, claro, dos artistas, em torno de um mercado e até de uma marca conveniente designados por "músicas do mundo", foi possível que fossem realizados cada vez mais concertos, festivais e digressões que têm trazido ao Ocidente músicos com passaportes que outrora não se viam nestas andanças. O circuito cresceu tanto que transbordou para outros espaços mais generalistas. Tornou-se comum ver Caetano Veloso, Tinariwen ou Amadou & Mariam a fazerem parte de cartazes de festivais de rock. O circuito tornou-se tão visível e tão apetecível que o inverso também se sucedeu: tornou-se comum ver as linguagens ocidentais nos festivais que antes eram só das tais músicas do mundo, nos catálogos que antes eram só das tais músicas do mundo. Há uma mão invisível a mexer o caldeirão. Ainda alguém sente a mesma necessidade da distinção das músicas do mundo?

Essas tais músicas do mundo cresceram, transbordaram e misturaram-se.

O próprio Byrne admite a mudança, ainda que deixando um pé atrás. Em entrevista recente à Wired, e a propósito do texto de 1999, dizia: "As coisas mudaram? Um pouco. Podemos ver a Rolling Stone ou talvez até a Pitchfork fazerem crítica ao novo disco do Caetano ou um do Lenine ou qualquer outro artista brasileiro, mas para a quantidade de criatividade que existe no mundo, somos muito localistas". Nota: já não é o termo "world music" que lhe faz confusão (e nunca terá sido uma questão assim tão semântica, convenhamos), mas sim o enviesamento "localista" que a generalidade dos ouvintes de música tem, e que o próprio admite que também se verifica do outro lado: "Eu mantenho o meu desprezo pelo termo -- significa que há um 'nós' e depois toda a gente restante. Mas, claro, pessoas de outras em outros países sentem da mesma maneira -- na Índia, és capaz de encontrar quiosques de cassettes em que 98% do material consiste nas últimas bandas sonoras de Bollywood, havendo talvez depois uma pequena secção 'internacional' com, na altura em que vi, Madonna e George Michael. A nossa xenofobia é um pouco mais pesada, contudo."

A questão da autenticidade, cara a Byrne no texto de 1999 e também agora citada por Pinto Ribeiro, está cada vez mais ultrapassada. São cada vez mais seguidas com atenção pública as experiências de fusão entre linguagens ocidentais e as mil e uma outras que antes iam parar ao escaparate único das músicas do mundo. Todos os dias, há uma ÁFrica diferente a contaminar, no bom sentido, a escrita de música de um grupo de rock nos EUA, em Londres ou nos arredores de Lisboa. Já ninguém se preocupa com a autenticidade do kuduro e os músicos angolanos andam em digressões por esse mundo fora, pisando palcos além da lusofonia.

Pinto Ribeiro traz ainda à colação outra preocupação legítima que merece alguma reflexão:
"[Os compositores não ocidentais] são remetidos para um género musical ao qual se retirou a história. E atente-se ainda como além de se retirar a história dessas músicas, retira-se também o contexto de onde as mesmas surgem e uma parte substantiva da sua comunicabilidade quando são cantadas. (...) Nesta forma de tratar com igual valor todas as músicas do mundo, fica-se também privado da dimensão política das canções, do simbolismo de muitas dessas composições e também da relação de entendimento de classes, conforme as origens regionais destas músicas."
Não há como negar isto. É a mais pura verdade, mesmo que haja muito boa gente que se ocupe a lutar contra isso, escrevendo, divulgando, programando. Mas isto leva a que se faça outra pergunta. Será que esta ausência de metainformação é exclusivo destas tais músicas do mundo? Quando vamos a um festival de jazz -- olhem, outro circuito que cresceu, transbordou e misturou-se -- quantos de nós sabemos o contexto histórico, político e social em que foram gerados os projetos americanos ou norugueses, recentes ou com décadas de existência, que ali vemos? Será que a maioria das pessoas que vai ver Patti Smith no próximo mês conhece Robert Mapplethorpe e a relevância que este teve no seu repertório musical e lírico? Em boa verdade, e esta questão é absoluta e inapelavelmente derradeira, entre todo o público do rock, quantos conhecem os Velvet Underground?

quarta-feira, 15 de julho de 2015

sexta-feira, 10 de julho de 2015

100 de Sines (até ver), o primeiro: CONGOTRONICS VS. ROCKERS




CONGOTRONICS VS. ROCKERS
(RD Congo / EUA / Suécia / Argentina)
Castelo
23 de julho de 2011

"Se o 'vs.' que aparece tanto no título deste espetáculo como no do disco que lhe deu origem aponta para uma batalha entre forças aparentemente opostas, podemos começar por dizer que no disco, saíram vencedores os rockers ocidentais. Podem vir dizer que fizeram batota, porque pegaram no trabalho já feito pelos congoleses e adaptaram-no às suas intenções, aos seus pontos de vista. Mas é um grande disco. Continuando a olhar para o 'vs.', os vencedores no palco já são claramente os congoleses. Juana Molina e os Deerhoof, principalmente a sua vocalista Satomi Matsuzaki, não se dão mal, ainda que na maior parte das vezes tenham os seus instrumentos com o som enfiado para baixo do tapete sónico construído pelas likembes eletrificadas (aquela espécie de pianos de mão ligados à distorção) e pela percussão dos africanos.
Todos estes considerandos sobre os vencedores da batalha interessam apenas para explicar uma diferença grande que opõe disco a espetáculo. Há outra ainda: no disco, são muitos mais os artistas envolvidos, principalmente entre os ocidentais. No palco, ainda que ali estejam 19 músicos (o 20.º encontra-se hospitalizado), o som acaba por ser mais homogéneo, mais coerente, em duas horas de dança obrigatória. Fez recordar, em grande medida, o concerto dos Konono nº 1 no Jardim Botânico de Lisboa, mais até do que outro que há mais tempo deram junto à praia de Sines, também no FMM, ou, ainda no festival, aqueloutro dos seus atuais parceiros de estrada, os Kasaï All Stars. Intenso, esgotante. Talvez o melhor concerto que alguma vez o FMM acolheu."

quinta-feira, 9 de julho de 2015

100 de Sines (até ver), 2: Tom Zé


TOM ZÉ
(Brasil)
Castelo
30 de julho de 2004

"No mundo da música, há as estrelas, que estão lá em cima, intocáveis, com a graça do brilho que dão a uma noite. Mas depois há os meteoros que conseguem, entre outras coisas, mudar o curso dos planetas ou provocar outras reacções com que os cosmógrafos se entretêm a debater. Tom Zé é um destes meteoros que, pelas mais diferentes razões, nunca conseguiu chegar a tanta gente quanto outras estrelas provenientes do Brasil. Foi muito bom na Culturgest, terá sido muito bom em Loulé e na Aula Magna, mas o melhor só pode ter sido mesmo o espectáculo no Castelo de Sines.
(...) As dezenas de pessoas que encheram a capela da Misericórdia para ouvir Tom Zé na sua 'conferência-de-não-conferencista' e os cinco ou seis milhares que assistiram ao seu concerto dificilmente terão abandonado Sines com opinião diferente. Por vezes rimos, por vezes chorámos, por vezes dançámos, por vezes saltámos e a toda a hora fomos levados por um moleque safado de 67 anos. Não há palavras suficientemente justas para Tom Zé, para as suas palavras, para as suas músicas, para a sua banda."

100 de Sines (até ver), 3: Black Uhuru feat. Sly & Robbie


BLACK UHURU FEAT. SLY & ROBBIE
(Jamaica)
Castelo
28 de julho de 2001

"Quem tenta reduzir a apreciação de um espectáculo somente à prestação dos artistas em palco pode estar a mirar a tromba do elefante à sombra da imensidão do bicho. Qualquer um sabe que para um bom espectáculo concorrem outros factores, inúmeros, uns mais frequentemente citados nas reportagens que outros, como o som, as características da sala, o público, etc. Para a posição cimeira que este espectáculo dos Black Uhuru com a secção rítmica mais importante da Jamaica, Sly & Robbie, ocupa nesta lista, toma peso um outro grande protagonista: o FMM. Foi o meu primeiro contacto com a magia de Sines e receio que isso só possa ser inteiramente compreendido por quem por lá passou ao longo destes anos, como os meus amigos que, a cada uma das vagas de estreia, irradiavam dos olhos um brilho verdadeiramente único (e não era da ganza). Foi neste espectáculo, no castelo de Sines, que assisti pela primeira vez ao famigerado fogo-de-artifício (mais uma daquelas coisas que soam mal, assim escritas, onde só quem já testemunhou um encerramento do FMM, como era o caso aqui, sabe verdadeiramente do que se está a falar). Cerca de dois anos depois, os artistas do palco voltaram ao nosso país, para um concerto na Voz do Operário (e talvez outros mais). Não foi mau, mas..."

quarta-feira, 8 de julho de 2015

100 de Sines (até ver), 4: Trilok Gurtu and the Misra Brothers


TRILOK GURTU AND THE MISRA BROTHERS
(Índia)
Castelo
28 de julho de 2006



Foi a segunda de três vezes que já tive a sorte de ver Trilok Gurtu, indisputavelmente o homem que melhor consegue trabalhar o ritmo neste planeta. Para esta actuação no FMM, a minha preferida da edição desse ano, veio acompanhado pela sua Índia, com as vozes khylal dos Misra Brothers.

100 de Sines (até ver), 5: Cyro Baptista / Pau na Mula


CYRO BAPTISTA / PAU NA MULA
(Brasil)
Castelo
24 de julho de 2009



(...) eis outro titã da percussão, o brasileiro Cyro Baptista. Se se juntassem os dois [ele e Trilok Gurtu], abrir-se-ia uma fenda na Terra, a qual se desviaria da sua rota orbital, e... (...) No topo dos topos, o espectáculo 'Pau na Mula', de Cyro Baptista e da sua companhia de percussionistas, que conquistou facilmente o público com a irreverência, algures a meio caminho entre Tom Zé e Hermeto Pascoal (dois compatriotas igualmente chanfrados que pisaram aquele mesmo palco) e o virtuosismo dos músicos. As partes do sapateado, por Nicholas Young, por exemplo, devem ter sido a coisa mais fora de comum e mais eficiente que já se viu neste festival. (...)

terça-feira, 7 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 6 ao 10


6. ROKIA TRAORÉ (Mali)
Castelo, 26/jul/2008::vídeo::
"Na segunda vez que a bela Rokia Traoré veio a Sines, teve honras de encerramento de noite no castelo. Trazia na bagagem o magnífico Tchamanché e o espectáculo foi, ao contrário do que a actuação de quatro anos antes e o próprio disco novo deixava antever, muito movimentado, ora por culpa dos músicos (recordo o excelente baixista), ora por culpa da postura avassaladora de Traoré em palco."

7. STAFF BENDA BILILI (RD Congo)
Castelo, 31/jul/2010::vídeo::
"Uma máquina de dança e alegria chamada Bilili. E a última grande explosão (literalmente até, pois coube-lhes as honras de fogo de artifício com que o FMM todos os anos se despede do castelo) veio com os Staff Benda Bilili. O disco era estupendo, já se sabia. Mas que os Staff Benda Bilili conseguissem, mesmo que esquecidos ou ignorados todos os problemas físicos que os debilitam, multiplicar a um ponto impensável toda aquela energia para o palco com as suas rumbas diabólicas e fazer transpirar as gentes no castelo daquela forma insana, era algo que nem nas minhas perspectivas mais optimistas encontrava lugar. Mais uma deixa para outra das razões para elogiar o FMM: estar sempre na linha da frente no que há de mais quente a surgir no meio. Foi assim quando trouxe cá os Taraf de Haïdouks, o Tom Zé, a Rokia Traoré, o casal Amadou & Mariam, os Konono nº1, o KNaan, o Cordel do Fogo Encantado, entre tantos outros."

8. BARBEZ (EUA)
Castelo, 30/jul/2010::vídeo::
"A gaja do theremin e os judeus nova-iorquinos. Os Barbez, grupo de Nova Iorque com ligações à Tzadik de John Zorn, apareceram no FMM com toda a pinta de outsiders. O grupo de Dan Kaufman já por cá tinha passado para um concerto na ZDB, para um concerto mediano, mas agora, com formação alargada e com um som perfeito que permitiu a percepção ao detalhe das texturas e frases criadas em palco, misturando klezmer com rock de câmara ou jazz marginal, a lembrar bandas da editora Constellation, tudo foi diferente, para melhor. Muito melhor. Houve algo que se manteve, contudo: o papel central de Pamelia Kurstin na música do grupo. Nunca se viu em Sines alguém a tocar theremin, o estranho instrumento literalmente intocável que os russos desenvolveram nos anos 20 do século passado (e para o qual Lenine chegou a receber aulas), e a estreia coube, felizmente, a uma das suas mais incríveis intérpretes (vejam o vídeo para apanharem breves imagens que testemunham esta afirmação). E os Barbez ofereceram ainda a deixa ideal para apresentar outra das razões pelas quais o FMM é tão particular: a abertura (e o bom gosto) da programação. Por esse país fora, por essa Europa fora, é muito frequente encontrar programadores de festivais de world music de olhos e ouvidos fechados para o que se passa fora daquela gaveta. Antes eram as músicas de tradição europeia, depois, com a globalização das tournées, vieram os africanos extra-PALOPs. E pouco mais do que isso. Festivais como o FMM e o MED Loulé vieram provar que se pode ir muito mais longe. (Já agora, e que tal alguma formação de Masada ou o próprio John Zorn numa próxima edição, hum?)"

9. MÁRIO LÚCIO (Cabo Verde)
Castelo, 30/jul/2011::vídeo::
"É engraçado saber -- foi o próprio que o disse -- que Mário Lúcio, na véspera do concerto, vestiu a pele de ministro da cultura de Cabo Verde, para discutir o Estado da Nação no parlamento do seu país. Um dia, o estado da sua nação. No outro, o mundo todo (mais palavras saídas da sua boca) que se aglomerava em Sines a dançar à sua música. Tivemos em palco alguém que sabe muito bem o que faz. São muitos anos de estrada, de como saber encher um palco, de como saber pôr um público em delírio. E o que temos ali não é apenas o que se pode ouvir nos discos. Há um artista e um grupo que o acompanha que se transformam, que vão além de Cabo Verde, que celebram a África sub-sariana em todo o seu esplendor. A ele ficam-lhe bem estas palavras, ditas perto do final: Sines devia mudar de nome, para... Sinergia. Devia ter sido o Mário Lúcio a festejar o fim dos concertos no castelo com o tradicional fogo-de-artifício."

10. DHAFER YOUSSEF (Tunísia)
Castelo, 27/jul/2012::vídeo::
"Dhafer Youssef e o quarteto do mundo. Dhafer Youssef pode não ser o mais exímio dos intérpretes de alaúde -- e nesse campo, até já ali tínhamos visto, dias antes, o prodigioso Bassam Saba, com o seu Al-Madar -- mas se aliarmos a essa capacidade o seu arrepiante domínio da voz, fazendo lembrar Milton Nascimento do inicio, mas com técnica imensuravelmente melhor, e a forma como o quarteto se entende nos diversos diálogos que se vão construindo ao longo do espetáculo, percebemos um pouco da magia, dos sorrisos de alegria na plateia, do sorriso que Youssef levou para fora do palco. Foi talvez o melhor episódio deste FMM."



segunda-feira, 6 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 11 ao 20


11. BASSEKOU KOUYATÉ & NGONI BA (Mali)
Castelo, 18/jul/2013::vídeo::

12. GISELA JOÃO (Portugal)
Castelo, 25/jul/2014::vídeo::
"(...) A Gisela é dona de uma voz incrível, uma das melhores desta nova geração, talvez mesmo a mais apaixonante. Mas há muito mais. O que a Gisela está a fazer pelo fado merece o agradecimento de todos nós que gostamos de música, de todos nós que temos esta relação tímida com a canção portuguesa. As biografias que o futuro lhe escreverá debruçar-se-ão, espero, sobre o meio em que cresceu – Barcelos, uma das três capitais nacionais do rock – enquanto mola determinante para a sua atitude em palco e fora dele. Talvez daí venha a Gisela iconoclasta, que entrou em cena de pernas ao léu, com um vestido branco, uma cor proibida por cartilha, para depois o trocar por um conjunto blusa-calção num chocante colorido de verão (estava demasiado vento para o vestido). Talvez daí venha a Gisela festiva e extrovertida, que contagiou toda a plateia do castelo na dança dos fados corridos e dos malhões. Talvez daí venha a Gisela com tudo de miúda e nada de diva, que improvisa momentos em palco, que não se deixa abalar e até disso tira partido quando um dos músicos se vê obrigado a abandonar por instantes o seu posto de trabalho. Artigo completo: A Gisela (ou barulho, que se vai cantar o fado)"

13. THE SKATALITES (Jamaica)
Castelo, 26/jul/2003
"(…) eis um dos melhores momentos de encerramento do historial do FMM."

14. AMADOU & MARIAM (Mali)
Castelo, 28/jul/2005

15. TRILOK GURTU BAND (Índia)
Castelo, 25/jul/2007::vídeo::

16. CORDEL DO FOGO ENCANTADO (Brasil)
Castelo, 29/jul/2006::vídeo::
"Em Sines, no ano passado, as opiniões sobre o espectáculo do Cordel do Fogo Encantado extremaram-se. Houve quem adorasse os brasileiros (eu! eu! eu!), houve quem os odiasse (cambada de autistas!). Opiniões medianas parece ser coisa que não houve."

17. MERCEDES PEÓN (Galiza)
Castelo, 27/jul/2011::vídeo::

18. OUMOU SANGARÉ & BÉLA FLECK (Mali / EUA)
Castelo, 21/jul/2012::vídeo::
"A Oumou e o Béla. Béla Fleck toca no banjo, acústico ou elétrico, como mais ninguém, aqui intrometendo-se na música do Mali e entregando ao seu instrumento, na maior parte das vezes, o pepel que a kora tradicionalmente assume nestas paragens da música africana, enquanto Oumou Sangaré domina o palco mostrando por que é uma das maiores divas da atualidade. É qualidade de sobra para um único projeto. Como se não bastasse, no grupo viajam ainda o baixista senegalês Alioune Wade -- de tal forma fluente na sua disciplina que quase faz esquecer o habitual companheiro de Fleck neste papel, o incrível Victor Wooten -- e o baterista Will Calhoun, dos Living Colour."

19. SÍLVIA PÉREZ CRUZ (Espanha)
Centro de Artes, 23/jul/2013::vídeo::
"A maior revelação do cartaz para quem escreve estas linhas, um tipo que agora se sente idiota e ignorante o suficiente por não a ter conhecido mais cedo. Sílvia Pérez Cruz é dona de uma voz ao mesmo tempo doce, ternurenta, mas também forte, interventiva e absolutamente segura, que usa o castelhano, o galego, o catalão e o português para arrebatar os corações do público. Esteve acompanhada por um guitarrista de trejeitos vanguardistas, indie para os dias que correm, adepto do ruído e dos pequenos pormenores, de vistas abertas e capacidades abrangentes (não estou a descrever o Marc Ribot, mas podia). Perto do fim, houve uma versão arrepiante de "Os Gallos", também conhecida por "Gallo Rojo, Gallo Negro", uma fábula anti-franquista. Alguém que disponibilize a gravação nos sítios do costume."

20. DAKHABRAKHA (Ucrânia)
Castelo, 20/jul/2013::vídeo::
"Se calhar, já podemos esquecer os Hedningarna ou as Värttinä ou outros grupos do Norte e Leste da Europa que nos anos 80 e 90 se destacavam no circuito de então, mais estreito e talvez menos global, da chamada world music. Os ucranianos DakhaBrakha, um homem e quatro mulheres, trouxeram a Sines a riqueza das harmonias vocais femininas, ora gentis, ora estridentes, amiúde contaminadas pela energia da dança dirigida tanto ao corpo como ao cérebro, sem nunca deixarem cair uma pinga do azeite aparente nesta fusão. Para muitos dos que me rodearam ao longo destes dias, terão sido mesmo a grande bomba do festival."

domingo, 5 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 21 ao 30


21. WARSAW VILLAGE BAND (Polónia)
Castelo, 29/jul/2004
"Esta foi a primeira vez que os polacos da Warsaw Village Band foram a Sines. Centrados na tradição folk do Norte da Europa, evocativos em parte dos Hedningarna e de outros projectos nórdicos, o grupo teve nesta edição uma actuação explosiva que não encontraria tanto eco assim no regresso ao local do crime, [em 2009]."

22. MOR KARBASI (Israel)
Centro de Artes, 20/jul/2009::vídeo::
"Ao meu lado, uma mulher batia com a mão no peito. Eu sentia os olhos a lacrimejarem. No palco, a israelita Mor Karbasi começava a cantar os primeiros versos de 'Rua do Capelão', de Amália Rodrigues, num português magnífico, com um arrojo vocal de fazer cair os queixos. Foi o momento da noite, será certamente um dos episódios mais notáveis desta edição do FMM, mas o espectáculo da israelita, acompanhada por piano, guitarra eléctrica, baixo e percussão, não se resumiu apenas a tal. Se há noites para a qual a palavra beleza existe é para descrever tanto Mor Karbasi como o seu espectáculo."

23. BARBEZ (EUA)
Castelo, 19/jul/2013::vídeo::
"É, pessoalmente, uma sensação forte esta de ter um coletivo como os Barbez, da vanguarda nova-iorquina, num festival como este. Diz muito sobre o que é esta festa. Os Barbez, esses, dão-se também lindamente com esse espírito. Uma vez mais, trouxeram ao palco um arranjo caleidoscópico de frases médio-orientais, de folclore do leste da Europa, de drones (os musicais, não os dos EUA) e outros arrepiamentos rock, de canções de revolta como a magnífica versão de "Bella Ciao". Fizeram ainda encore com uma versão dos Residents (e parecia que não podia ser mais natural a invocação). "

24. TOUMANI DIABATÉ (Mali)
Castelo, 27/jul/2006::vídeo::

25. KTU (Finlândia / EUA)
Castelo, 30/jul/2005::vídeo::

26. MARC RIBOT & THE YOUNG PHILADELPHIANS (EUA)
Castelo, 29/jul/2005
"(…) nómada da música (das músicas), doutor da guitarra (das guitarras). Neste FMM, só os KTU de Kimmo Pohjonen [e Amadou & Mariam] o ultrapassaram na lista de preferências."

27. SEPTETO ROBERTO JUAN RODRIGUEZ (Cuba)
Castelo, 31/jul/2004
"A maior surpresa do festival, aqui para o tasco, foi Roberto Juan Rodriguez. Klezmer, muito klezmer, irrepreensivelmente tocado, com os timbalões de Rodriguez a evocar os ritmos da sua terra natal, Cuba. E Rodriguez é mesmo um colosso na bateria, algo que ficou por demais evidente no encore final. As muralhas do castelo de Sines não ruiram por pouco."

28. GAITEIROS DE LISBOA (Portugal)
Castelo, 27/jul/2006
"Vi os Gaiteiros o mais que pude nos anos 90. Depois, o grupo deixou de ter uma presença habitual nos palcos, na mesma medida que se levantaram complicações às edições de novos trabalhos. O espectáculo no Castelo de Sines serviu de reencontro com o que continuo a achar ser o que melhor aconteceu à música portuguesa nos tempos recentes. E não falo apenas no ghetto das tradicionais, porque reduzir os Gaiteiros a tal é nunca ter compreendido aquilo que eles fazem."

29. SHIBUSA SHIRAZU ORCHESTRA (Japão)
Castelo, 26/jul/2013::vídeo::
"Mais de 30 japoneses em palco, uma orquestra psicadélica, um maestro que bebe cerveja e fuma, uma personagem na frente que parece o Kratos do God of War e outros mimos que lhe sucedem, duas bailarinas que passam o espetáculo inteiro a fazer coreografias com bananas de plástico, um tipo a pintar um dragão-largarto-golfinho numa tela branca que vai subindo com o andar da noite, uma medusa gigantesca que aparece mais para o fim e flutua sobre o castelo. É isto um teatro japonês, um noh, um kabuki? Se ignorarmos algumas pequenas incursões fáceis pelas ondas balcãs-ska, serão os Pink Floyd e os Gong de olhos rasgados a triparem numa comuna teatral? Incrível."

30. GOGOL BORDELLO (EUA / Ucrânia)
Castelo, 28/jul/2007::vídeo::
"Sábado à noite, a gogolândia instalou-se no Castelo. Não foi preciso muito para que aqueles milhares de pessoas começassem a suar abundamente aos pulos com que acompanhavam a música. Continuo a achar os Gogol Bordello demasiado azeiteiros, da voz a alguns padrões rítmicos muito semelhantes ao nosso 'pimba', continuo a achar que estão muito longe de serem uma versão balcânica dos Pogues ou dos Ukrainians (porque estes sabiam tocar a sério e sem puxar alarvemente pelo lado "cheesy" da coisa), mas, porra, incendiaram o castelo (calhou-lhes bem o tradicional fogo de artifício do FMM). Fizeram aquilo que era pedido para terminar os concertos no castelo: uma enorme festarola."

sábado, 4 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 31 ao 40


31. ORCHESTRA BAOBAB (Senegal)
Castelo, 24/jul/2008::vídeo::
"Antecipei muito, mas mesmo muito este espectáculo, ao ponto de recear que o excesso de expectativa contra-atacasse na altura. Mas acabei por não conseguir parar de dançar do início ao fim, de sorriso idiota estampado na cara."

32. BASSEKOU KOUYATÉ & NGONI BA (Mali)
Centro de Artes, 17/jul/2008::vídeo::
"Não foi preciso muito para que toda a gente presente no pequeno auditório de Sines ficasse rendida ao blues dançante proporcionado pelas ngoni (guitarra maliana) do grupo de Bassekou Kouyaté, que já tinha dado um excelente concerto no África Festival, em Belém, no ano anterior."

33. CARLOS BICA TRIO AZUL C/DJ ILL VIBE (Portugal / Alemanha / EUA)
Castelo, 26/jul/2007::vídeo::
"Chamei na altura à actuação do trio Azul com o convidado Ill Vibe "festival de fronteiras abertas". O conservadorismo é palavra que nunca fez parte do dicionário de Carlos Bica, Frank Möbus e Jim Black, músicos de outro mundo que se encaixaram de forma perfeita com um DJ para fazer coisas bonitas, como diria o Artur Jorge, em palco."

34. N'DIALE - JACKY MOLARD QUARTET & FOUNÉ DIARRA TRIO (Bretanha / Mali)
Castelo, 29/jul/2010::vídeo::
"Quem imaginaria que a música de tradição europeia a que o bretão Jacky Molard se tem dedicado ao longo da carreira, e que já apresentou por duas outras ocasiões em Sines, casaria tão bem com a música do trio maliano de Founé Diarra? Quem é que é capaz de dizer, sem mais nem menos, que um prato de peixe e de carne, em simultâneo, se pode tornar uma maravilha da gastronomia? A este respeito, aliás, o António Pires dizia que 'o gajo que inventou a carne de porco à alentejana deve ter tido uma experiência semelhante'. E como é que dançamos isto? Com as pernas para a frente ou com o rabo espetado para trás? Estas eram as interrogações iniciais de muitos, certamente, mas não foram mesmo mais do que isso mesmo: iniciais. Rapidamente, todos atirámos os axiomas etnomusicológicos para trás das costas e abraçámos calorosamente aquela que foi uma das experiências mais incríveis de sempre no palco do castelo."

35. GAITEIROS DE LISBOA (Portugal)
Castelo, 26/jul/2013::vídeo::

36. RACHID TAHA (Argélia)
Castelo, 27/jul/2007::vídeo::
"Receava-se que, à semelhança do que se viu há pouco tempo no youtube, a propósito de um concerto realizado algures na Europa, Rachid Taha se entornasse mais do que devia e ainda viesse a cair rotundo no palco. No backstage, na primeira vez que o vi, eu quase receei que ele caísse para cima das saladas do buffet. Ai, ai. Mais tarde, encontrei o tour manager que me deu um abraço forte como se dele fosse um amigo de há longuíssima data. Ai, ai. Mas a grande verdade é que, depois, o concerto acabou por ser realmente aquilo por que se ansiava. Hora e meia de material ao qual o corpo não consegue resistir, com incursões por "Barra Barra", "Ecoute-Moi Camarade", "Rock El Casbah" e outros temas obrigatórios. No final, na parte dos agradecimentos, percebeu-se ainda que toda a banda estava quase tão entornada como Rachid Taha."

37. FAIZ ALI FAIZ (Paquistão)
Castelo, 25/jul/2008::vídeo::
"No qawwali, música religiosa dos sufistas paquistaneses trazida ao resto do mundo pela voz de Nusrat Fateh Ali Khan, não é de todo necessário entender-se as palavras com que aqueles homens sentados no chão pretendem levar a comunidade de ouvintes ao wajd, ao estado de êxtase, ao contacto com Alá. Verborreia religiosa à parte, se Alá é aquilo a que a cerimónia de Faiz Ali Faiz desencantou, eu quero ser islamista (e, não vale a pena irem por esse caminho que estão a pensar: ao contrário de outras, aquela noite até foi serena nisso)."

38. YASMIN LEVY (Israel)
Castelo, 29/jul/2010::vídeo::
"Em 2009, o FMM ofereceu-nos Mor Karbasi. Em 2010, tivemos direito a Yasmin Levy, uma voz para a qual faltam adjectivos na língua portuguesa, uma actuação de fazer mexer com todos os sentidos."

39. VISHWA MOHAN BHATT & THE DIVANA ENSEMBLE (Índia)
Castelo, 28/jul/2011::vídeo (CONCERTO COMPLETO!)::
"Qualquer que seja a origem, qualquer que seja o credo, qualquer que seja a raça, há todo um mundo unido pela música das sete notas... Disse-o, mais ou menos assim, o mestre Vishwa Mohan Bhatt algures a meio da interpretação irrepreensível da sua slide guitar modificada com cordas simpáticas, ao jeito de instrumentos indianos como a sitar. Como se não bastasse o virtuosismo do mestre, o grupo de músicos ciganos do Rajastão que o acompanhava deu mais uma lição sobre a diáspora da música, de como o canto do flamenco não é assim tão diferente destes antigos músicos dos rajás. Até uma espécie de prima das castanholas mediterrânicas estava lá para ajudar à festa. Fica para a memória de momentos singulares deste festival -- eu estou quase a chamar-lhe-ia epifanias -- aquele em que o mestre fazia ditados rítmicos cada vez mais rápidos para os seus companheiros de palco..."

40. JACKY MOLLARD ACOUSTIC QUARTET (Bretanha)
Castelo, 24/jul/2007::vídeo::
"Foi, para mim, o primeiro grande estrondo do FMM deste ano. É certo que, em Porto Covo, os Etran Finatawa e o Darko Rundek já tinham rendido bastante, mas na segunda-feira, no Centro de Artes de Sines, o Acoustic Quartet do bretão Jacky Mollard produziu a primeira das grandes maravilhas ao vivo do festival. A canção irlandesa tem andado um pouco arredada dos festivais de música do mundo, se exceptuarmos naturalmente os intercélticos que se vão realizando pelo Norte do país. Quando se encontra um "fiddler" como o Jacky Mollard (parecido com o Fausto como qualquer outro bretão) é motivo de grande regozijo. Já para não falar do encontro de novo com ele na companhia do seu acordeonista na esplanada do bar do Salão Musical, para uma jam até às tantas da manhã..."

sexta-feira, 3 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 41 ao 50


41. HARRY MANX (Ilha de Man)
Praia, 26/jul/2007::vídeo::
"À medida que o sol ia ameaçando desaparecer até ao dia seguinte, o manês (espécie de gentílico inventado à pressa para quem provém da Ilha de Man) Harry Manx cativou o público junto à praia, com o seu blues impregnado de raga, com uma mohan veena (uma guitarra adaptada à música clássica indiana. Aprendi a cortar na palavra sublime como quem corta no açúcar para o café, mas aqui vou ter que dar uma facadinha e usar o termo. Sublime."

42. IVA BITTOVÁ (República Checa)
Centro de Artes, 22/jul/2008
"Grandes vozes. Iva Bittová, com grande empenho dramático e solta de compromissos líricos, num registo que vai do demoníaco ao pueril, do soturno ao cómico. (…) Uns assustavam-se com esta mulher checa nas suas explorações de carácter mais dramático. Outros arrepiavam-se com as suas capacidades vocais. Ou no violino. Mais um postal de Sines bem guardado na memória."

43. FLAT EARTH SOCIETY MEETS JIMI TENOR (Bélgica / Finlândia)
Porto Covo, 19/jul/2008::vídeo::
"Virtuosos de outro planeta. A Flat Earth Society, enquanto colectivo. (…) Será porventura exagero, mas talvez houvesse mais músicos em palco do que pessoas no público a conhecerem a obra de Jimi Tenor. Mas isso, aqui, neste festival, não só não é novidade, como até potencia a criação de momentos de descoberta que são de aplaudir. Mas nem tão pouco parece que este interessante encontro da big band com o génio excêntrico do finlandês, outrora do mundo das electrónicas e afins, tenha aguçado por aí além a curiosidade do povo. Mas, para quem prestou atenção, todo o espectáculo foi percorrido por grandes ideias."

44. ERIKA STUCKY (Suíça)
Castelo, 28/jul/2007::vídeo::
"A suíça Erika Stucky foi uma das maiores surpresas deste festival. O uso que faz da voz, seja no formato spoken word (magnífica a versão para 'These Boots Are Made for Walking'), seja na canção, seja nos yodelays, aliado à boa disposição que atravessou toda a actuação, ajudou a que este espectáculo possa ficar retido na memória por bastante tempo."

45. L'ENFANCE ROUGE (França / Itália / Tunísia)
Praia, 22/jul/2009::vídeo::
"Na praia, houve também alguns concertos verdadeiramente explosivos, a começar pelo dos franco-magrebinos L'Enfance Rouge, numa reencarnação de uns Sonic Youth do tempo do EP de estreia ou de "Confusion is Sex" (já para não falar das semelhanças gritantes entre as baixistas de ambos os projectos), de uns Swans ou de uns Shellac mais roufenhos ainda, mas com uma integração magnífica com instrumentos árabes que estiveram nesta formação e que, aliás, contribuíram para o excelente "Trapani ~ halq al waady", álbum de há dois anos. "

46. MOSCOW ART TRIO (Rússia)
Centro de Artes, 21/jul/2008
"Virtuosos de outro planeta. (…) Qualquer um dos músicos do Moskow Art Trio. (…) Grandes vozes. (…) Sergey Starostin, dos Moskow Art Trio."

47. RACHEL UNTHANK & THE WINTERSET (Inglaterra)
Praia, 25/jul/2008::vídeo::
"Grandes vozes. (…) As irmãs Unthank."

48. ASIF ALI KHAN & PARTY (Paquistão)
Castelo, 25/jul/2013::vídeo::

49. ETRAN FINATAWA (Níger)
Praia, 20/jul/2007::vídeo::

50. TINARIWEN (Mali)
Castelo, 30/jul/2010::vídeo::

quinta-feira, 2 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 51 ao 60


51. TTUKUNAK (País Basco)
Centro de Artes, 23/jul/2007::vídeo::
"Quem já viu Kepa Junkera ao vivo, já saberia o que é uma txalaparta, mas os outros tiveram oportunidade de a conhecer através das duas irmãs que formam o grupo Ttukunak."

52. MAHMOUD AHMED (Etiópia)
Centro de Artes, 26/jul/2007::vídeo::

53. BELLOWHEAD (Inglaterra)
Castelo, 25/jul/2007::vídeo::

54. TARTIT (Mali)
Castelo, 26/jul/2007::vídeo::

55. K'NAAN (Somália)
Praia, 26/jul/2006::vídeo::
"O K'Naan é o maior. Ontem, junto à praia, e depois do prog celta do Jacques Pellen, tivemos direito a assistir a uma das maiores explosões do festival. Chama-se Keinan Warsame, mas é mais conhecido por K'Naan. Nasceu na Somália, mas vive "exilado" no Canadá. Usa o hip hop como arma, com letras arrepiantes como "não se supunha que eu passasse dos 14" ou como naquela em que ele fala da infância em Mogadíscio enquanto pergunta "is this hardcore?" (com bocas ao 50 Cent e a outros pelo meio). Foi muito, muito forte, lirica e musicalmente."

56. BALOJI (RD Congo)
Castelo, 19/jul/2013::vídeo::
"(…) que animal de palco"

57. FEMI KUTI (Nigéria)
Castelo, 31/jul/2004
"(…) e para o fim um Femi Kuti em grande forma"

58. ROKIA TRAORÉ (Mali)
Castelo, 25/jul/2013::vídeo::

59. AYARKHAAN (Iacútia)
Castelo, 29/jul/2011::vídeo::
"Já se sabia que o espetáculo das Ayarkhaan não iria deixar ninguém indiferente. As técnicas de canto usadas, em aliança com o estranho efeito que retiram do khomus, um berimbau de boca típico daquelas paragens orientais, penetram fundo nos sentidos que usamos durante um concerto. A perícia com que o grupo da veterana Albina Degtyareva o faz, expressa ora nos guinchos e relinchares que julgávamos estarem no campo das impossibilidades da voz humana, ora nos jogos rítmicos guturais feitos no berimbau, fazem elevar a consideração por este trio."

60. MASTER MUSICIANS OF JAJOUKA (Marrocos)
Castelo, 30/jul/2005

quarta-feira, 1 de julho de 2015

100 do FMM (até ver), do 61 ao 70


61. VITORINO E JANITA SALOMÉ COM GRUPO DE CANTADORES DE REDONDO (Portugal)
Castelo, 28/jul/2010::vídeo::
"O Alentejo não seria o mesmo se não tivessemos os irmãos Salomé. E este foi um dos momentos mais bonitos, arrepiantes até, do FMM, que este ano inaugurou o slot no horário para o final de tarde no castelo"

62. LE TRIO JOUBRAN (Palestina)
Castelo, 22/jul/2011::vídeo::
"Como dizia antes do festival, ouvir um alaúde bem tocado já é inebriante. Ora, torna-se difícil dizer o que é ouvir três tipos a fazerem-no ao mesmo tempo e, ainda por cima, a manterem diálogos vertiginosos e frequentemente improvisados, talvez possíveis apenas a quem cresceu junto, como estes irmãos Joubran."

63. FATOUMATA DIAWARA (Costa do Marfim / Mali / França)
Castelo, 26/jul/2012::vídeo::
"Fatoumata Diawara, a linda. Começou como Rokia Traoré, sua compatriota, no primeiro dos seus dois concertos em Sines. Calma, serena, intimista. Acabou como Rokia no segundo. Explosiva, festiva, imparável. Fatoumata Diawara, provavelmente a mulher mais bonita que alguma vez pisou o palco do castelo de Sines, foi a grande revelação deste ano."

64. SECRET CHIEFS 3 (EUA)
Castelo, 22/jul/2011::vídeo::
"Quem pensar que Trey Spruance é um monstro intratável, bem pode tirar daí a ideia. Nos bastidores, abundava não só em simpatia e humildade, como em curiosidade pelo que havia sido estas 13 edições de festival. Sentiu-se até "estúpido" por tocar a seguir ao Trio Joubran, como se pode ouvir no vídeo, na "flash interview" dada ao Mário Dias. Em formato de quinteto, surpreendeu muita gente que não esperava a música pesada dos SC3 no festival. E poderia ter sido um espetáculo ainda melhor, não fosse o longo tempo que perdia entre cada tema, a afinar a guitarra, por exemplo, e que fazia arrefecer o público, já por si apanhado nas noites frias do primeiro fim de semana do FMM."

65. HUGH MASEKELA (África do Sul)
Castelo, 28/jul/2012::vídeo::
"Masekela, o génio de palco. Já anda pelos setentas e afirma-se como músico desde os 5. Todos estes anos de digressões, discos, experiências bem sucedidas por África e pelos EUA, fizeram dele a maior lenda viva da música africana. E é ali no palco que ele o prova. Não só mantém intacta toda a sua capacidade técnica instrumental e vocal, como sabe como poucos como se dirigir a uma audiência, mesmo que seja para a "picar". "

66. REIJSEGER FRAANJE SYLLA (Países Baixos / Senegal)
Castelo, 20/jul/2013::vídeo::
"(…) o Sylla é dono de uma voz incrível, que nem precisa de amplificação, como no começo do concerto, quando vagueou pela multidão, de garganta escancarada"

67. STAFF BENDA BILILI (RD Congo)
Castelo, 26/jul/2012::vídeo::
"(…) Junte-se ainda os Staff Benda Bilili, que regressaram àquele palco apenas dois anos depois, por força do cancelamento do concerto de Gurrumul. Houve festa rija, claro, ainda que pudesse ter ajudado ter havido um maior distanciamento face ao anterior concerto dos congoleses."

68. BASSAM SABA AL-MADAR (Líbano / EUA)
Castelo, 20/jul/2012::vídeo::

69. BOMBINO (Níger)
Castelo, 19/jul/2012::vídeo::
"Há que falar também no Bombino, que no primeiro dia do festival, levou a festa dos blues a todos os que ali estavam, num formato intenso e marcadamente hipnótico, muito diferente daquele que apresentou no ano passado, em Lisboa. O pobre do Otis Taylor, que tocou imediatamente antes, terá inventado “trance-blues”. Talvez tenha ficado envergonhado ao ouvir o trance no blues do guitarrista do Níger."

70. BOOM PAM (Israel)
praia, 26/jul/2008::vídeo::


terça-feira, 30 de junho de 2015

100 do FMM (até ver), do 71 ao 80


71. KONONO NO.1 (RD Congo)
praia, 30/jul/2005

72. KIMI DJABATÉ (Guiné-Bissau)
Castelo, 30/jul/2010::vídeo::
"Já sabemos, mas ainda não somos muitos, que o Kimi Djabaté é um dos músicos maiores que connosco convivem. É grande nos discos, é grande nas actuações a solo, mas experimentem deixá-lo aparecer com a banda completa, incluindo o genial Galissá na kora."

73. MORIARTY (EUA)
Centro de Artes, 22/jul/2008::vídeo::

74. WALDEMAR BASTOS (Angola)
Castelo, 23/jul/2008::vídeo::

75. SILVÉRIO PESSOA (Brasil)
praia, 24/jul/2008::vídeo::

76. TARAF DE HAÏDOUKS (Roma / Roménia)
Castelo, 0/jul/2001

77. KTU (Finlândia / EUA)
Castelo, 25/jul/2008::vídeo::
"Virtuosos de outro planeta. (…) Qualquer um dos KTU."

78. WIMME (Lapónia)
praia, 29/jul/2010::vídeo::
"Há mais de dez anos que ansiava por um concerto dele por cá e nunca imaginei que fosse tão bem recebido como foi ali em Sines, no palco da praia, ao fim da tarde, para uma música que se imagina nas montanhas, no frio."

79. HANGGAI (China)
Castelo, 23/jul/2009
"Calhou termos assistido ao concerto dos chineses Hanggai ao lado um do outro e o Manuel foi aproveitando os intervalos para discutir algumas ideias interessantes. A que mais guardei prendia-se com a curiosidade de o canto gutural (ou próximo de gutural), algo que os Hanggai transportam para o seu universo rock, se ter desenvolvido em pontos diversos do mundo com uma característica comum: áreas pouco densamente povoadas. (texto completo, "Músicas Universais e Paralelas", aqui.)"

80. UXÍA (Galiza / Portugal / Guiné-Bissau)
Castelo, 22/jul/2009::vídeo::

segunda-feira, 29 de junho de 2015

100 do FMM (até ver), 81 ao 100

Vem aí julho, vem aí FMM. A 17.ª edição do Festival de Músicas do Mundo de Sines acontece de 17 a 25 de julho e tem como enormíssimo cabeça de cartaz o maliano Salif Keita (última noite). Mas antes de mais, retrospetivemos um pouco, alimentemos essa nostalgia danada. Começo aqui a minha lista de concertos diletos do FMM ao longo destes anos, entre mais de três centenas de coisas boas (e umas ou outras não tão boas assim) que vi e das quais tirei notas. Aproveito também para recordar algumas das palavras escritas no passado a respeito de alguns destes momentos inesquecíveis.


81. CHUCHO VALDÉS BIG BAND (Cuba)
Castelo, 23/jul/2009::vídeo::

82. HERMETO PASCOAL (Brasil)
Castelo, 29/jul/2005

83. ALINE FRAZÃO (Angola)
Centro de Artes, 23/jul/2013::vídeo::

84. SIBA E A FULORESTA (Brasil)
Centro de Artes, 17/jul/2008::vídeo::
"(…) Festa popular. Siba e a Fuloresta no exterior do Centro de Artes, com o Siba a improvisar versos dedicados a Sines, às pessoas e ao festival. (…)"

85. MARIEM HASSAN (Saara)
Castelo, 29/jul/2006
"Grandes surpresas [do FMM 2006]: K'Naan e Mariem Hassan."

86. L’ENFANCE ROUGE & LOFTI BOUCHNAK (França / Itália / Tunísia)
Castelo, 20/jul/2012::vídeo::

87. CHICHA LIBRE (EUA)
praia, 24/jul/2009::vídeo::
"Na praia, ainda, destaque também para os Chicha Libre, que, apesar do mau som com que começaram o espectáculo, foram melhorando cada vez mais, até terminarem com uma estrondosa versão de "Guns of Brixton", dos Clash."

88. LEE 'SCRATCH' PERRY (Jamaica)
Castelo, 25/jul/2009::vídeo::
"No último dia do FMM, as atenções, claro, estiveram voltadas para Lee 'Scratch' Perry. No backstage, o clima era de um alvoroço nunca visto, com toda a gente à espera da chegada da lenda do dub, que aconteceu minutos antes do concerto. Do lado da plateia, uma imensa multidão esperava também ansiosamente que este senhor de 73 anos de idade subisse ao palco, o que faria depois da habitual introdução da banda de suporte, enfeitado da cabeça aos pés, multi-colorido, ainda que o dourado assumisse domínio, "trashy" como diria a miudagem fashionistas de hoje, e transportando uma mala de viagem que não serviu para nada a não ser ajudar a compor a imagem. Instantes depois, veio um dos momentos com que o FMM marca a última actuação do castelo desde a sua primeira edição, o fogo-de-artifício. Ainda que menos espampanante que em outros anos, colou muito bem a "Fire", um dos temas de "Repetance", o álbum que Andrew W.K. (!) produziu para Perry no ano passado. O resto da noite prosseguiu com o dancehall entaramelado de Perry, típico dos anos recentes da carreira do jamaicano, que fez toda a gente dançar e suar até ao fim."

89. SEUN KUTI & EGYPT 80 (Nigéria)
Castelo, 29/jul/2006::vídeo::

90. DEBASHISH BHATTACHARYA (Índia)
Castelo, 24/jul/2009::vídeo::

91. JANITA SALOMÉ (Portugal)
Castelo, 22/jul/2009::vídeo::

92. RABIH ABOUH-KHALIL & JOACHIM KÜHN & JARROD CAGWIN (Líbano / Alemanha / EUA)
Castelo, 27/jul/2006

93. JP SIMÕES (Portugal)
Castelo, 20/jul/2013::vídeo::
"(…) a música é ótima, os interlúdios nunca falham (…)"

94. KASAÏ ALLSTARS (RD Congo)
Castelo, 23/jul/2009

95. HAZMAT MODINE (EUA)
Porto Covo, 18/jul/2008
"Virtuosos de outro planeta. (…) Wade Schuman, dos Hazmat Modine, na harmónica. "

96. GALANDUM GALUNDAINA (Portugal)
Porto Covo, 20/jul/2007::vídeo::

97. OUMOU SANGARÉ (Mali)
Castelo, 25/jul/2007::vídeo::

98. WORLD SAXOPHONE QUARTET (EUA)
Castelo, 27/jul/2007::vídeo::

99. NURU KANE (Senegal)
Castelo, 28/jul/2006

100. 34 PUÑALADAS (Argentina)
Castelo, 29/jul/2010::vídeo::
"Quem os viu e quem os vê. Cinco anos depois, os 34 Puñaladas voltaram a Sines, voltaram a dar um espectáculo ao fim de tarde, mas agora, numa formação mais reduzida, e com as guitarras e o tremendo calor da voz do Alejandro Guyot a darem ao tango a dignidade e a ousadia que realmente merece."

terça-feira, 2 de junho de 2015

100 de 1973, o primeiro deles todos: ENO - HERE COME THE WARM JETS



HERE COME THE WARM JETS
ENO (Inglaterra)
Edição original: Island
Produtor(es): Brian Eno
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Para lá de toda aquela imagem andrógina e espampanante com que Brian Eno aparecia em público na altura, ainda na espuma da onda do glam, havia, já se sabia, um esteta compulsivo com requintes de cientista louco quando montava laboratório nos estúdios de gravações. Reza a lenda que para esta sua estreia a solo terá reunido 16 músicos razoavelmente diferentes para que do choque entre as diversas abordagens pudesse captar a energia do acidente. Assim como os físicos que se entretém a ver partículas a coliderem entre si. Chamou a si todos os Roxy Music, à exceção de Bryan Ferry. Foi buscar o baterista Simon King aos Hawkwind e o baixista Paul Rudolph aos vizinhos Pink Fairies, também ele futuro Hawkwind. De Canterbury, chamou o baixista Bill MacCormick, dos Matching Mole. Dos King Crimson, vieram o guitarrista Robert Fripp, com quem Eno já tinha trabalhado no excelente "(No Pussyfooting)" (ver abaixo nesta lista) e o baixista John Wetton. Ainda teve a ajuda do guitarrista Chris Spedding. Depois, continua a lenda, dançou para eles. Ou melhor, Eno dirigiu os músicos através da dança e de outros sinais, corporais ou verbais, aos quais estes iam respondendo em simpatia. Na posse das gravações individuais, lançou-se depois a um meticuloso trabalho de mistura, corte e costura, do qual fez parir uma dezena de canções das quais se diz terem poucas ou nenhumas semelhanças com os contributos originais. À boa maneira inglesa da altura, juntou-lhe rapidamente letras cómicas que soassem bem e que, à exceção da história do dragão humano A.W. Underwood invocada em "The Paw Paw Negro Blowtorch", pouco ou nenhum sentido fizessem. É que a voz era mais um instrumento manipulado pelo cientista louco.

Ao 12.º dia, o criador chamou-lhe um álbum e descansou.

Há nestas dez canções ainda muito dos Roxy Music, claro, pelo menos na forma como Eno veria o grupo de onde tinha saído meses antes. As duas primeiras faixas, "Needles In The Camel's Eye" e "The Paw Paw Negro Blowtorch" são bons exemplos dessa espécie de declaração de interesses de Eno. Em "Baby’s on Fire" também, mas aqui já tínhamos a guitarra incendiária de Fripp a pegar fogo aos modelitos de lantejoulas, num solo que ainda parece furar os ouvidos de muita gente nos dias de hoje. "Cindy Tells Me" volta ao glam, por via da pop dos anos 60, como se fosse revista pelos Velvet e depois esticada pela saturação de efeitos de Eno. Em "Driving Me Backwards", parece que há um filme a andar para trás, enquanto um pianista se houve do fundo de uma cave, exortando os seus demónios, momento negro que é logo compensado pela beleza de "On Some Faraway Beach", uma melodia de tons nostálgicos que fica no ouvido, uma fórmula que Eno viria a repetir aqui e em discos futuros. Volta ao glam em "Blank Frank", porventura deitando mais ácido sarcástico para cima do seu passado recente. Cheia de voz e de letras parvas e boas vem depois "Dead Finks Don’t Talk". Pop épica a abrir uma alameda de aclamação para os dois grandes momentos finais do disco. Talvez devamos dizer os monumentos finais do disco. O primeiro, "Some of Them Are Old", lembra Robert Wyatt ou outro amigo deste, Ivor Cutler, mas aqui Eno, ou melhor, os vários Enos que aqui ouvimos em coro conduzem a folk que constitui a melodia da canção a cenários cósmicos, como quando Sun Ra levava o bebop para além de Saturno. No final da canção fica um piano solto, perdido no espaço, como que uma sinfonia do rasto radiofónico do big bang, a qual se continua a ouvir, se estiverem bem atentos, na faixa final, que dá ou recebe o título do álbum. Nela, voltamos aos traços nostálgicos que Eno tão bem consegue deixar numa canção, seja a solo, seja nas bandas que já produziu até hoje. É tão bom este momento que não conseguimos fazer outra coisa que não seja voltar a ouvir o disco do princípio.

A meio caminho entre o glam, cujo prazo estava a acabar, e o punk, que batia à porta, Brian Eno conseguiu um disco da mais extraordinária pop. Pop para gente chanfrada, é certo, mas pop extraordinária. E vanguardista, até para os dias de hoje.


(Antes que alguém venha do Wikipedia com a reclamação de que o disco saiu já em janeiro de 1974, aconselha-se primeiro a leitura da página de discussão das alterações que esse artigo já teve, nomeadamente no que à data de lançamento concerne. Também poderá ver o registo no Discogs ou, talvez ainda mais importante..., o próprio disco. O meu, em CD, tem claramente indicação de 1973 como ano da edição original...)

segunda-feira, 1 de junho de 2015

100 de 1973, n.º 2, José Afonso



VENHAM MAIS CINCO
JOSÉ AFONSO (Portugal)
Edição original: Orfeu, Arnaldo Trindade & Cª
Produtor(es): José Niza
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"A formiga no carreiro vinha em sentido contrário, caiu ao Tejo ao pé de um septuagenário. Larpou, trepou às tábuas que flutuavam nas águas e do cimo de uma delas virou-se para o formigueiro: mudem de rumo, já lá vem outro carreiro."

Sim, o país iria mudar de rumo no ano seguinte. José Afonso vinha ajudando a erguer uma certa tensão pré-revolucionária, convocando pelo país inteiro os ânimos dos revoltados. O regime, que cada vez mais dificuldades teria em gerir a crescente sublevação trazida pelas artes populares, em particular pela música de Afonso e de outros, respondia com a prisão: em maio de 1973, o cantor era encerrado na prisão de Caxias, por onde ficou durante vinte dias. Aí, diz-se ter escrito várias das canções que compõem este álbum, como aquela que viria a ser o extraordinário poema de "Era um Redondo Vocábulo". No outono do mesmo ano, reuniu-se em Paris com José Mário Branco e quase duas dezenas de músicos franceses, para gravar o disco, que viria a ser lançado em Portugal no Natal seguinte.
Apesar de toda esta tensão, que poderia fazer regressar algum do imediatismo que as canções de José Afonso tinham tido em discos anteriores, "Venham Mais Cinco" não é um disco direto ou pragmático. Há letras que são de leitura direta, é certo, e que talvez por isso se tornariam banda sonora obrigatória da revolução, como a do próprio tema-título ou "A Formiga no Carreiro" (acima citada). Em todo o caso, José Afonso vinha, já desde os discos imediatamente anteriores, a trilhar com sabedoria novos caminhos de modernidade, que parecem impossíveis de terem encontrado eco favorável no atraso do país de então. Era como se a semente da educação, que Afonso tanto se empenhou a espalhar pelo país ao longo dos anos, estivesse agora a dar frutos. Portugal já podia acolher um disco como "Venham Mais Cinco", já podia acolher esta modernidade invulgar estampada nas letras, nas composições e nos arranjos. Era como se uma espécie de tropicalismo à portuguesa estivesse a nascer, pelas mãos do maior génio que as nossas músicas conheceram.

domingo, 31 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 3, Can



FUTURE DAYS
CAN (Alemanha)
Edição original: United Artists
Produtor(es): Can
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Holger Czukay: "Bel Air [a faixa de 20 minutos que ocupa o segundo lado de Future Days] mostrou os Can como um grupo de sinfonias elétricas que pintava uma paisagem pacífica ainda que por vezes dramática".

Menos rock, menos focado, menos terreno, mais ambiental, mais planante, mais atmosférico. Ao quinto álbum, os Can passavam a pintar paisagens sonoras, dando o mote para a música ambiental. "Moonshake", o mais curto dos quatro temas que compõem o disco, é talvez a exceção, o último ponto de focagem. Os restantes são para se serem ouvidos sem pressas, com a mente livre para voar. "Future Days" marca este ponto de viragem na carreira dos Can, que, pouco depois, veriam o vocalista Damo Suzuki sair. Os Can continuariam com a arquitetura de paisagens no álbum seguinte, "Soon Over Babaluma".

sábado, 30 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 4, Neu! (rep.)



NEU! 2
NEU! (Alemanha)
Edição original: Brain
Produtor(es): Conny Plank, Neu!
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O segundo tomo da ofensiva conduzida por Klaus Dinger e Michael Rother abre de forma semelhante à álbum estreia. 11 minutos e 17 segundos de "Für Immer", demonstração perfeita daquilo que viemos a reconhecer como a assinatura dos Neu!, que tanta gente influenciou ao longo destes quarenta anos. Também como no disco do ano anterior, as faixas que se seguem são menos de motorika (assim chamaram os jornalistas ao binário do baterista Dinger) e mais de colagens sonoras e improvisações experimentadas em estúdio. É o que se passa principalmente no lado B, uma sequência de versões diferentes do single "Neuschnee/Super", lançado entre o 1º e o 2º disco, que aqui os Neu! manipularam de diferentes formas. De uma súbida carência (de dinheiro para continuarem em estúdio), surge uma das primeiras experiências de remistura e reconstrução de gravações previamente editadas, como entretanto se veio a tornar habitual no negócio da música.
Como no primeiro álbum (e no terceiro), foram precisas quase três décadas para que houvesse uma edição em CD. Até 2001, o ano em que a Astralwerks reeditou os três álbuns, só apareciam edições piratas à venda.

sexta-feira, 29 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 5, Tom Zé (rep.)



TODOS OS OLHOS
TOM ZÉ (Brasil)
Edição original: Continental
Produtor(es): Milton José
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Todo compositor brasileiro é um complexado.
Por que então esta mania danada, esta preocupação de falar tão sério, de parecer tão sério, de ser tão sério, de sorrir tão sério, de chorar tão sério, de brincar tão sério, de amar tão sério?

(in "Complexo de Épico")

Quarto disco de Tom Zé, que por esta altura, depois de ter dado uma importante mão ao avanço do tropicalismo -- ele que talvez fosse o mais tropicalista de todos, acabou sendo ignorado, havendo até quem lhe chamasse "Trotski do tropicalismo" -- entrava na fase mais obscura da sua carreira, que só terminaria já perto dos anos 90, quando David Byrne repôs um pouco de justiça no mundo ao apadrinhá-lo via Luaka Bop. Talvez por aparentar ser mais experimentalista que os álbuns anteriores, "Todos os Olhos" acabou por vender pouco. Mas estão lá todos os elementos pelos quais hoje reconhecemos Tom Zé como uma das maiores forças criativas que o Brasil viu nascer. Tem coisas próximas do samba, tem coisas próximas do forró nordestino ("Quando eu Era Sem Ninguém"), tem coisas próximas dos cantares ao desafio ("Dodó e Zezê"), tem muito de Brasil no que de diversamente rico o Brasil tem, sem nunca soar a "conservador", palavra proibida em todo a carreira de Tom Zé e frequente no reportório de outros artistas da música brasileira, mesmo os mais afoitos. A capa de "Todos os Olhos" é também protagonista de uma história curiosa. Durante anos pensou-se (e talvez ainda por aí circule a ideia) que a imagem na capa era a de um ânus com um berlinde nele depositado. Era essa, contudo, a ideia inicial do poeta Décio Pignatari, um dos fundadores do concretismo brasileiro, como forma de afronta à ditadura militar. O olho do cu. Todos os Olhos. É o que parece, é o que muita gente pensou durante anos que era, até eventualmente o próprio Tom Zé, que terá ajudado a perpetuar o mito. A fotografia original chegou a ser feita, mas como era óbvia demais para enganar os censores, a opção recaiu sobre os lábios da boca (da mesmo modelo). Como se diz aqui, eis que o cu que deveria imitar um olho se torna uma boca que imita o cu.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 6, Iggy & The Stooges (rep.)



RAW POWER
IGGY AND THE STOOGES (EUA)
Edição original: CBS
Produtor(es): Iggy Pop, David Bowie
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Entre esta centena de discos, "Raw Power" é provavelmente o que conheço há mais tempo, de uma velhinha cassette que tanto terá rodado que ainda hoje recordo, quase nota por nota, o fuzz do James Williamson, quase berro por berro, a verborreia do Iggy Pop. Reza a história que, por esta altura, os Stooges já tinham acabado. A Elektra já não queria saber deles. O álbum homónimo de estreia (1969) e "Fun House" (1970) tinham vendido pouco. É neste contexto que Iggy Pop conhece David Bowie. Muda para a mesma empresa de management do inglês e viaja para Londres com Williamson para gravar um disco a solo. Não encontra músicos ingleses que o satisfaçam e chama os irmãos Ron e Scott Asheton. Os Stooges voltavam assim a gravar, mas agora o grupo chamar-se-ia, de forma honesta, Iggy & Stooges. Bowie produziu num só dia sete das oito faixas, a partir de... três pistas que Iggy Pop lhe passou, banda na primeira, guitarra solo na segunda e a voz na terceira. O resultado, ainda que com a limitada cirurgia plástica que Bowie conseguiu fazer, não deixa de ser uma amálgama sonora de fuzz e berraria puxados aos limites, que, para a altura, mesmo para o contexto de Detroit de onde vinham os Stooges, metia medo. Parecia que queriam destruir tudo o que lhes aparecesse pela frente. Parecia tudo aquilo que anos mais tarde se encontraria na explosão do punk em Inglaterra. Mas, muitos anos depois, Iggy Pop, talvez para destruir ainda mais, voltaria a colocar "Raw Power" na história por outros motivos. À produção de Bowie sucedeu-se, em 1995, uma versão pirata, com a primeira mistura de Pop. Mas em 1997, numa reedição em CD da Columbia, Pop pegaria em tudo de novo para produzir aquele que é, mesmo para os dias de hoje, um dos discos com volume permanentemente mais alto de sempre, um trabalho que desagradou meio mundo, incluindo os próprios James Williamson e Ron Asheton.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 7, Gong (rep.)



FLYING TEAPOT
GONG (França/Inglaterra)
Edição original: Virgin
Produtor(es): Giorgio Gomelsky
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Se isto fosse a lista dos discos mais chanfrados de 1973, este estava batido no topo. A chanfradice não vem só do tema cósmico que atravessa todo o disco, apesar de ser uma história que merece a pena ser contada. Inspirada numa alegada visão do vocalista australiano Daevid Allen durante uma lua cheia na páscoa de 66, a história de "Flying Teapot" fala de um egiptologista suinicultor, Mista T Being, a quem um vendedor de rua de bules antigos e colecionador de rótulos de chá, Fred the Fish, vende um brinco mágico, o qual é capaz de captar mensagens do planeta Gong através de uma estação pirata de rádio chamada Radio Gnome Invisible. Os dois viajam para o Tibete onde se encontram com o abominável homem da cerveja, Banana Ananda, que passa o tempo a cantar "Banana Nirvana Mañana" e se embebeda com Foster's... Só por isto, já merece a pena ir até ao fim do mundo à procura deste disco. Esta história está então na base da trilogia aqui iniciada e prosseguida em "Angel's Egg" -- 64.º nesta lista -- e em "You" (1974). Mas, dizia atrás, a chanfrandice não vem só da história. Musicalmente, "Flying Teapot" é um disco de loucos. Só tipos completamente fora do registo de lucidez que a sociedade entenda como normal seriam capazes de chegar a composições e a arranjos desta natureza, um autêntico frenesi de géneros (jazz, rock, prog e muito mais), de instrumentos, de ritmos, de tempos. É o melhor, a par com "Camembert Electrique" (1971), da fase Allen. Pode não chegar para dar alucinações como a que ele teve naquela tal páscoa, mas poucas vezes a música consegue chegar tão perto de ser assim tão alucinante.

terça-feira, 26 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 8, José Mário Branco (rep.)



MARGEM DE CERTA MANEIRA
JOSÉ MÁRIO BRANCO (Portugal)
Edição original: Guilda da Música
Produtor(es): José Mário Branco
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«Não foi por vontade nem por gosto que deixei a minha terra»
(in "Por Terras de França")

Segundo álbum do exilado José Mário Branco e, em certa medida, continuação do primeiro, "Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades" (1970). Em jeito de parêntesis, tenho aqui um pequeno, minúsculo problema entre mãos (mais um). É que "Margem de Certa Maneira" não saiu, tecnicamente, em 73. Foi gravado em novembro de 72, em França, e foi lançado poucos dias antes do Natal. Pormenores. Fim de parêntesis e avante com o que interessa. Algumas destas canções vinham de um projeto anterior de José Mário Branco com o escritor e jornalista Álvaro Guerra, "Crónicas". A censura, que andava mais atenta desde 71, rejeitou dois terços do trabalho, que foi assim posto de lado e aqui recuperado em parte. Nos arranjos (não será José Mário Branco o melhor arranjador que este país alguma vez conheceu?), nos instrumentos (o estranho cromorno em "Engrenagem" ou no tema-título remete ouvidos atuais para outros iconoclastas geniais, os Gaiteiros de Lisboa), na reconstrução de uma certa musicalidade portuguesa, se assim lhe podemos chamar, ainda para mais num disco que, curiosamente, é gravado essencialmente por músicos franceses, "Margem de Certa Maneira" é tanto ou mais revolucionário que o seu antecessor, é tão ou mais digno de figurar para sempre na galeria das melhores obras de autores portugueses. Como em Zeca Afonso, com quem José Mário Branco tantas vezes trabalhou, a música popular portuguesa dava um passo gigantesco em frente. E nos temas abordados, "Margem de Certa Maneira" parece tão atual como então. Ou ainda mais.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 9, Kraftwerk (rep.)



RALF UND FLORIAN
KRAFTWERK (Alemanha)
Edição original: Philips
Produtor(es): Conny Plank, Ralf Hütter, Florian Schneider
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Como o título não deixa escapar, a formação era constituída por Ralf Hütter e Florian Schneider, que deixou o grupo em 2008. Em 1973, os Kraftwerk estavam de novo reduzidos ao duo fundador, depois de por lá ter passado gente como Michael Rother e Klaus Dinger, que viriam a ser os Neu!. Na verdade, ao duo deve ser acrescentado o nome de Conny Plank, o produtor que acompanhava os Kraftwerk desde o início e que esteve por trás do som de tanta boa gente do kraut, como os já mencionados Neu! (todos os álbuns), os Kluster/Cluster (idem), Harmonia, Guru Guru, Ash ra Tempel, etc. "Ralf und Florian" (ou "Ralf and Florian" nas edições internacionais) é essencialmente instrumental e aponta para aquela que será a marca do som dos Kraftwerk daí para a frente, assentando essencialmente na experimentação de sintetizadores e no uso de caixas de ritmo.
(Passaram mais de quarenta anos. Digam lá se não vos parece ouvir o Panda Bear no "Tanzmuzik", por exemplo. Em todo o caso, o desafio traz água no bico... é que o Panda Bear até já o samplou.)

domingo, 24 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 10, Tom Waits (rep.)



CLOSING TIME
TOM WAITS (EUA)
Edição original: Asylum
Produtor(es): Jerry Yester
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Now it's closing time, the music's fading out
Last call for drinks, I'll have another stout.
Well I turn around to look at you, you're nowhere to be found,
I search the place for your lost face, guess I'll have anotherround
And I think that I just fell in love with you.

(in "I Hope That I Don't Fall in Love with You")

Entre os discos que constam da minha coleção pessoal e desta longa lista, este é aquele que comprei há mais tempo. Na adolescência, ouvia tanta gente a tecer todo o tipo de elogios a Waits que tinha de perceber o que era. Não tínhamos youtube nem sequer internet para sacar discos, diria agora um avozinho meio trocado das ideias. A rádio, ou melhor, o António Sérgio era uma das poucas hipóteses de ouvir música antes de a comprar (a outra era, claro, o já tão longínquo sistema de partilha de discos entre amigos). Mas adiante. Aconteceu que "Closing Time" não bateu à primeira. Só com "Heartattack and Vine" (1980) ou "Swordfishtrombones" (1983) se faria luz e só anos mais tarde, já com meia discografia de Waits na estante e nos ouvidos, é que o álbum de estreia voltaria à liça, como se fosse preciso conhecer o porteiro deste bar fumarento de jazz, country e canção americana que é "Closing Time".

sábado, 23 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 11, John Cale (rep.)



PARIS 1919
JOHN CALE (País de Gales)
Edição original: Reprise
Produtor(es): Chris Thomas
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Tendo trabalhado com La Monte Young e Tony Conrad, tendo ajudado a fazer história no rock com os Velvet Underground, tendo depois trabalhado com Terry Riley e produzido discos para muito boa gente, John Cale surpreendeu, ao abrir ainda mais a sua área de intervenção com este "Paris 1919". Soberbo, belo, elegante, sofisticado, arrojado, luxuoso, poético, literário. Ao longo dos anos, têm sido usada toda a espécie de adjetivos apreciativos. É para isso que eles estão no dicionário.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 12, Gentle Giant (rep.)



IN A GLASS HOUSE
GENTLE GIANT (Inglaterra)
Edição original: WWA
Produtor(es): Gentle Giant, Gary Martin
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"Tens que levar esse disco", dizia-me o Fernando Magalhães na casa do "vendedor". Esta história já tem mais de 10 anos e o "vendedor" era um melómano que havia perdido o interesse na extensa discografia prog (e não só) da década de 70 que colecionara. "In a Glass House" e outros, como o "Naked Shakespeare" do Peter Blegvad, o "1001º Centigrades" dos Magma, mudavam assim de casa, mas de todo o produto da rapina, seria o disco dos Gentle Giant aquele que maior fascínio viria a despertar nos meus ouvidos. É, provavelmente, o disco prog a que continuo a recorrer com maior frequência, até hoje. São desconcertantes as mudanças de tempos, o encaixe meticuloso dos instrumentos de diferente espécie, a incursão por pequenos trechos folk, medievais até, e a precisão das costuras que unem todos estes retalhos. Por mais que tenha vindo a tentar, nenhum outro disco dos Gentle Giant conseguiu reproduzir o mesmo efeito. Eu bem tinha que ter trazido este disco.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 13, The Modern Lovers



THE MODERN LOVERS
THE MODERN LOVERS (EUA)
Edição original: Beserkley
Produtor(es): John Cale, Robert Appere, Alan Mason
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Um caso de batota -- ou meia batota, convenhamos -- nunca vem só. Se o disco dos Mutantes chegou à luz do dia apenas em 1992, eis aqui outro caso de parto tardio, ainda que a espera não tenha sido tão longa. O primeiro álbum dos Modern Lovers, de Jonathan Richman, saiu em 1976, mas as sessões produzidas na sua maioria por John Cale eram do ano que aqui se anda há meses a destacar. E aqui há que explicitar as sessões produzidas pelo ex-Velvet, que se traduziriam nessa tal edição de 76, pois este debute dos Modern Lovers acabou por vir servido em diferentes versões ao longo dos anos. Até o profícuo Kim Fowley esteve envolvido em produções diferentes das primeiras canções do grupo de Richman. Por outro lado, é curiosa a participação de Cale no disco, já que Richman é provavelmente o músico que melhor soube herdar e prosseguir o legado dos Velvet Underground, até hoje, mais do que o próprio produtor, mais do que a outra força motora, Lou Reed. Aqui, temas como "Roadrunner", o grande hit do disco, "Pablo Picasso", tema obrigatório do reportório de Richman ao longo das décadas, ou "Girl Friend", são daquela afirmação as melhores das evidências. Se uma das maiores tautologias do rock apregoa que a música nunca seria a mesma sem os Velvet na sua história, manda a justiça que também se diga que toda a cena independente que conhecemos seria tremendamente diferente se não fosse por esta criatura diletante que ainda hoje fascina pequenas plateias e que frequentemente a história tende a esquecer: Jonathan Richman.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 14, Os Mutantes (rep.)



O "A" E O "Z"
OS MUTANTES (Brasil)
Edição original: Philips
Produtor(es): Os Mutantes
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«O "A" e o "Z"» surge nesta lista com, enfim, alguma batotice. Afinal, foi editado apenas em 1992, quase 20 anos depois de ter sido gravado. Em 1973, a Polydor não terá encontrado valor comercial num disco que diz-se ter sido composto e executado sob o efeito de LSD e chegou mesmo a despedir a banda. Foi o primeiro álbum dos Mutantes que comprei e devo confessar que, na altura, não suscitou o mesmo entusiasmo que o conseguido na descoberta (posterior) dos álbuns anteriores, em particular os dois primeiros, homónimos, mas com o tempo e com audições mais atentas, o disco veio crescendo. Já sem Rita Lee, os Mutantes assumiam-se definitivamente progs, épicos até, culminando no assombro de faixa que é "Uma Pessoa Só" ou no tema musical de abertura e fecho, os tais A e Z, com que o disco abre e encerra. Era ácido do melhor.

terça-feira, 19 de maio de 2015

100 de 1973, n.º 15, Vangelis O. Papathanassiou (rep.)



EARTH
VANGELIS O. PAPATHANASSIOU (Grécia)
Edição original: Vertigo
Produtor(es): Vangelis O. Papathanassiou
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É a loucura total? Vangelis nesta lista? E em 15º? Vamos com calma. "Earth", tido oficialmente como o primeiro disco a solo de Vangelis, embora para trás houvesse já outros discos -- bandas sonoras e álbuns lançados sem a autorização do músico grego --, é um verdadeiro encanto para os ouvidos, do primeiro ao último minuto. Da explosão rock de "Come On" (youtube abaixo), a faixa de abertura (que outros álbuns conhecem que comecem com toda esta garra?), até à derradeira "A Song", um poema narrado sobre o tapete de sintetizadores que viriam a caracterizar a obra de Vangelis nos anos subsequentes, encontramos em "Earth" inúmeros motivos de interesse que nos fazem ouvi-lo vezes sem conta, tanto por prazer, como por vontade de descobrir pormenores, como quando nos aproximamos e nos afastamos as vezes que queremos de um quadro pendurado numa exposição. "Earth" é um disco rico em pormenores nos ambientes mais ou menos prog (do bom), mais ou menos étnicos e, claro, nas poucas e contidas piscadelas de olho à vindoura new age. Para os ouvidos de hoje, até as harmonias e os ritmos vocais dos Animal Collective ali parecemos ouvir ("Sunny Earth" ou "Ritual"). Vangelis, por onde te meteste tu depois?