sexta-feira, 24 de setembro de 2004

Em prol do tinittus (*)

OVO na ZDB
(ontem)

Dir-se-á, em determinado contexto, que Stefania Pedretti não distingue um Fa de um Re. A mascarada arrepia a sua stratocaster como Blixa Bargeld ou como dezenas de guitarristas nova-iorquinos da chamada no wave e arranca do objecto padrões de ruído que constituem a face mais livre dos OVO. O mesmo se passa quando pega num arco de violino para friccionar os seus longos dreadlocks ou retira do próprio rabeco sons próximos daquele que faz uma unha a raspar um quadro de ardósia ou ainda quando berra para o microfone como um qualquer vocalista de death metal. A seu lado, é o baterista Bruno Dorella, também ele devidamente mascarado, que sustenta tão extravagantes devaneios sónicos. Mas, alto lá, pois ainda que Bruno desenvolva outros projectos em áreas mais eruditas -- ligadas à música contemporânea de câmara, estando mesmo a pensar vir a trabalhar com a sua irmã, uma das mais famosas bailarinas clássicas de Itália -- ele não é a face convencional e formal dos OVO. Para começar, o seu kit de bateria é constituido unicamente por um timbalão de chão, uma tarola e um prato. Nada de pedais. Mas isso é suficiente para lhe permitir desenhar sequências rítmicas de reminiscência industrial. E quando se esgota a experiência na "bateria", Bruno interage com o meio-ambiente que o rodeia (atira pratos para o vidro da ZDB e deambula pela sala à procura de tudo que possa ser percutido, sem perder uma única vez a noção do ritmo). Ou então, evoca os Neubauten quando percute as cordas de um baixo cheio de efeitos que se encontra espojado no chão do palco. Stefania pensará talvez que arpeggio é o nome de um primo afastado, mas ela e Bruno, o ruído e a percussão em aceso ritual de acasalamento, conseguem demonstrar que há vida inteligente para lá dos planetas rock que o senso comum conhece. Talvez por isso fossem tantas os olhos esbugalhados que se encostavam, do lado de fora, às vitrinas da ZDB. Maria, anda ver estes extra-terrestres!
Depois dos Zu, padrinhos espirituais dos OVO, tal como Bruno referia após o concerto, terem ali dado naquele mesmo espaço um dos melhores concertos deste ano, a ideia que fica é que há, para os lados de Milão, um filão a pesquisar com atenção...
(8/10)

(a não perder hoje, no Porto, com os Mécanosphère a ajudarem também à festa.)

(*) o fenómeno do zumbido nos ouvidos, conhecido por todos os "concert-goers".

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