Não gostei do Last Days...
É uma valente modorra. Blake (o Kurt Cobain de Gus Van Sant) aparece retratado como um heroinómano, presume-se, no seu mais profundo estado de decadência. Murmura, cai, levanta-se, morre aos poucos. É, porém, uma reprodução, ainda que forçada, da decadência humana que qualquer um de nós já testemunhou, entre o círculo de amigos, na vizinhança, na escola, etc. E, provavelmente, acaba por ser uma visão fiel, em certa medida, à matéria em que Van Sant se baseou para trabalhar o filme. Mas hora e meia de Blake é cansativa. Sabe-se desde o início, naturalmente, que aquela desgraça não tem qualquer saída. E isso cria angústia no espectador, não por simpatia, como cordas que reagem ao movimento de outras, mas antes porque o espectador cada vez menos aguenta as quedas e os murmúrios daquele desgraçado, cada vez menos aguenta aqueles tiques forçados de puto indie...
...mas gostei do Last Days
Quase paradoxalmente, é justamente o vazio destes últimos dias de Blake que acaba por dar valor ao filme. Van Sant podia ter feito uma bio pic cheia de "rock'n'roll glamour", repetindo tudo o que meio mundo já disse acerca do líder dos Nirvana e da sua morte. Podia ter-se espalhado ao comprido, como Oliver Stone se espalhou com o filme dos Doors. Mas conseguiu, porém, ter o discernimento de não seguir esse caminho. Blake/Cobain é um comum heroinómano em fim de viagem, tal como porventura teria sido, no passado, um puto igual a qualquer outro. Não é o líder do ressurgimento do rock'n'roll, não é o Cristo do movimento grunge (a mais grave mentira MTV de sempre), nada disso. Discordo, por isso, em absoluto com o Miguel Guedes, dos Blind Zero, quando ao fim do filme, no debate que a Medeia Filmes promoveu, se queixava por ver Kurt Cobain a ser tratado como "uma pessoa como qualquer um de nós" e que "os Nirvana e o seu líder deviam ter outro tratamento, pelo que foram". Van Sant procurou exactamente o inverso, creio. Fugiu, tal como Blake foge a todos os que o procuram durante aqueles últimos dias, à imensa cacofonia mediática posterior à morte de Cobain (ou, se quisermos, posterior à saída de "Nevermind"...)
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