sexta-feira, 31 de julho de 2009

Músicas universais e paralelas


Hanggai "Drinking Song" @ FMM Sines

Há cerca de uma semana, por ocasião do FMM, marquei presença na apresentação do livro "Músicas nas Cidades", do meu caro amigo Manuel Fernandes Vicente. Já aqui falei por várias vezes da obra. Um dos seus pontos interessantes é a tese que o Manuel defende de que o meio ambiente, neste caso, as cidades ou as regiões, condiciona em grande parte (ou condicionou) a criação, neste caso, a música. O autor cita, como um dos primeiros exemplos com que se deparou na sua vida de melómano, o caso das bandas kraut, que ele bem cedo começou a distinguir de acordo com a cidade alemã de que eram originárias.

Calhou termos assistido ao concerto dos chineses Hanggai ao lado um do outro e o Manuel foi aproveitando os intervalos para discutir algumas ideias interessantes. A que mais guardei prendia-se com a curiosidade de o canto gutural (ou próximo de gutural), algo que os Hanggai transportam para o seu universo rock, se ter desenvolvido em pontos diversos do mundo com uma característica comum: áreas pouco densamente povoadas. Nunca tinha feito essa ligação, mas, de facto, temos as vastas estepes da Mongólia, onde os Hanggai foram buscar esta técnica. Temos as grandes planícies do interior norte-americano, onde os índios praticavam também um género de canto semelhante. Temos a Lapónia, uma região ocupada por Noruega, Finlândia, Suécia e Rússia, onde o povo sami tem no canto yoik, uma tradição. Bate certo.

Noutra alusão, o Manuel falava-me dos instrumentos de corda fabricada a partir de crina de cavalo que os Hanggai usavam. Até o nosso conhecido violino é ainda tocado com arcos feitos a partir de crina. Será aqui mais difícil sustentar desenvolvimentos em paralelo do mesmo tipo de instrumento, até porque os historiadores da música sugerem que os primeiros violinos podem mesmo ter sido os morin huur como aquele que os Hanggai trouxeram a Sines, e que, por via das rotas comerciais, chegaram à Europa há cinco ou seis séculos, transformando-se em violinos, violoncelos, etc. Gostaria, contudo, de imaginar que a simples proliferação de um animal doméstico como o cavalo teria ajudado a fazer nascer, de forma autónoma, instrumentos semelhantes em diferentes partes do mundo. Assim como ainda hoje me faz confusão que um instrumento como a gaita-de-foles exista em tantas partes diferentes da Europa (e não só), com formas absolutamente diversas e métodos igualmente díspares. Afinal, ovelhas, cabras e vacas, a partir do couro das quais é feito o instrumento, existia (e existe) por todo o lado. Não poderia a simples disponibilidade em abundância do material ter constituído ponto de partida para que a mesma ideia surgisse, em paralelo, em diferentes pontos?

Exemplos como estes, com maior ou menor segurança na defesa desta tese, não faltarão. Remotamente relacionado com isto, há também paralelismos curiosos nas linguagens das canções, nos temas que abordam, naquilo que pretendem comunicar. Este "Drinking Song" dos Hanggai, por exemplo, pode ser cantado em cantonês ou em qualquer outra língua oriental, que não precisaria deste título em inglês para que, ao escutá-lo, percebessemos que se trata de uma canção de... copos. Faz lembrar, por exemplo, o "Engwish Bwudd", dos norte-americanos Man Man. Ou uma boa parte da... folk irlandesa. Canções de bêbedos para bêbedos. Se pusermos de lado o mundo islamista, um tema como este é, convenhamos, universal. É imediatamente percebido por uma boa parte do mundo.

Na primeira vez que os Hanggai tocaram esta canção (ela foi repetida já no encore), lembrei ao Manuel que, depois da experiência das "Músicas nas Cidades", das músicas que pertencem a uma cidade, podia estudar as músicas que pertencem, ao mesmo tempo, a diferentes cidades, ao mundo, quem sabe sem qualquer ligação entre si na origem. É o meio ambiente a mandar, à mesma. É a velha psicogeografia, de que os situacionistas tanto gostavam. O desafio ficou lançado, Manuel.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Regresso às aulas

Ainda nem chegamos a Agosto e já está aí anunciado o primeiro grande nome do "regresso às aulas": Fuck Buttons, dias 30 de Setembro e 1 de Outubro, no Plano B e na ZDB, respectivamente.

O nascer do sol no Bailarico S. do FMM

segunda-feira, 27 de julho de 2009

O momento arrepiante da actuação da Mor Karbasi

Notas finais do FMM: o castelo e a praia


(Fotografia João Gonçalves)

"Sines seria perfeita se o ano tivesse duas semanas: uma de Festival e uma para descansar", lia-se na tabacaria do largo dos Correios (assim o diz a minha amiga Arlinda). Acabou a 11ª edição do FMM e agora há que voltar à normalidade dos dias, à neura da espera.
Depois da "manga" por Porto Covo, depois dos dois dias de calma com concertos no Centro de Artes, a festa regressou ao castelo e à praia, onde se pôde assistir a momentos inesquecíveis:

No topo dos topos, o espectáculo "Pau na Mula", de Cyro Baptista e da sua companhia de percussionistas, que conquistou facilmente o público com a irreverência, algures a meio caminho entre Tom Zé e Hermeto Pascoal (dois compatriotas igualmente chanfrados que pisaram aquele mesmo palco) e o virtuosismo dos músicos. As partes do sapateado, por Nicholas Young, por exemplo, devem ter sido a coisa mais fora de comum e mais eficiente que já se viu neste festival. Também pouco usual (se é que alguma vez aconteceu) foi a exigência bem sucedida do público para um segundo encore. Mesmo depois do encerramento do palco pela voz do Mestre de Cerimónias Mário Dias, o público continuou a entoar a frase melódica com que tinha literalmente participado no tema anterior, a pedido de Cyro Baptista, e a festa voltou.

No último dia do FMM, as atenções, claro, estiveram voltadas para Lee 'Scratch' Perry. No backstage, o clima era de um alvoroço nunca visto, com toda a gente à espera da chegada da lenda do dub, que aconteceu minutos antes do concerto. Do lado da plateia, uma imensa multidão esperava também ansiosamente que este senhor de 73 anos de idade subisse ao palco, o que faria depois da habitual introdução da banda de suporte, enfeitado da cabeça aos pés, multi-colorido, ainda que o dourado assumisse domínio, "trashy" como diria a miudagem fashionistas de hoje, e transportando uma mala de viagem que não serviu para nada a não ser ajudar a compor a imagem. Instantes depois, veio um dos momentos com que o FMM marca a última actuação do castelo desde a sua primeira edição, o fogo-de-artifício. Ainda que menos espampanante que em outros anos, colou muito bem a "Fire", um dos temas de "Repetance", o álbum que Andrew W.K. (!) produziu para Perry no ano passado. O resto da noite prosseguiu com o dancehall entaramelado de Perry, típico dos anos recentes da carreira do jamaicano, que fez toda a gente dançar e suar até ao fim.

Dias antes, na abertura do castelo, a noite foi também memorável pelo seu conjunto. Não é habitual haver uma programação temática, propriamente dita, para os dias do festival, mas esta foi feita de propósito: guitarra portuguesa com Rui Vinagre, um homem da terra; Janita Salomé acompanhado por alguns dos melhores músicos portugueses da actualidade (José Salgueiro, Mário Delgado, Yuri Daniel, José Peixoto, ...); Uxía, acompanhada por Manecas Costa e Zeca Medeiros, chegou, tal como Janita, a cantar José Afonso; e Acetre, um grupo da extremenha Olivença, que também passou pela música tradicional portuguesa.

Na quinta-feira, os chineses Hanggai provaram ao vivo o valor que lhes era reconhecido no disco de estreia. Rock épico misturado com cantos guturais e instrumentos tradicionais da Mongólia, com direito a bis para "Drinking Song", um tema festivo que, apesar da língua em que é cantado, é imediatamente compreendido por quase toda a gente...

Na praia, houve também alguns concertos verdadeiramente explosivos, a começar pelo dos franco-magrebinos L'Enfance Rouge, numa reencarnação de uns Sonic Youth do tempo do EP de estreia ou de "Confusion is Sex" (já para não falar das semelhanças gritantes entre as baixistas de ambos os projectos), de uns Swans ou de uns Shellac mais roufenhos ainda, mas com uma integração magnífica com instrumentos árabes que estiveram nesta formação e que, aliás, contribuíram para o excelente "Trapani ~ halq al waady", álbum de há dois anos. Na praia, ainda, destaque também para os Chicha Libre, que, apesar do mau som com que começaram o espectáculo, foram melhorando cada vez mais, até terminarem com uma estrondosa versão de "Guns of Brixton", dos Clash.

Agora, é esperar mais 300 e tal dias.

Lista dos concertos favoritos nestes nove dias de FMM09:

1º Cyro Baptista/Pau na Mula
2º Mor Karbasi
3º L'Enfance Rouge
4º Uxía
5º Lee 'Scratch' Perry
6º Chicha Libre
7º Hanggai
8º Chucho Valdés Big Band
9º Dele Sosimi Afrobeat Orchestra
10º Debashish Bhattacharya

(Ah, e o Bailarico Sofisticado deste ano deve ter provavelmente sido o melhor do FMM até hoje. Pelo menos, na nossa opinião não independente. Foi seguramente aquele em que mais nos divertimos.)

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Mais notas, ainda mais telegráficas, do FMM: as noites do Centro de Artes

Ao meu lado, uma mulher batia com a mão no peito. Eu sentia os olhos a lacrimejarem. No palco, a israelita Mor Karbasi começava a cantar os primeiros versos de "Rua do Capelão", de Amália Rodrigues, num português magnífico, com um arrojo vocal de fazer cair os queixos. Foi o momento da noite, será certamente um dos episódios mais notáveis desta edição do FMM, mas o espectáculo da israelita, acompanhada por piano, guitarra eléctrica, baixo e percussão, não se resumiu apenas a tal. Se há noites para a qual a palavra beleza existe é para descrever tanto Mor Karbasi como o seu espectáculo. Vamos a ver o que aí virá, mas este foi, para já, o meu concerto preferido.
Continuando com juventude no cartaz desta segunda-feira, vieram os Portico Quartet, grupo de jazz de Londres que coloca no hang, uma espécie de steel drums com ar de woks fechados, embora muito semelhantes no som ao instrumento tipicamente caribenho. Apesar de todo o groove e virtuosismo do contrabaixista, é pena que nada de arrojado se oiça justamente dos hangs..
Depois de uma belíssima segunda-feira, a noite de ontem foi para esquecer. Os aromenos são provavelmente a pior banda que já passou pelo FMM (alguém se lembrou do Cui Jian, no ano passado, o que faz lançar a dúvida). Já a cabo-verdiana Carmen Souza foi bem mais interessante, sem conseguir porém que o formato cool jazz das suas deslumbrar.
Começam hoje os concertos no castelo e na praia. Vai rebentar!

domingo, 19 de julho de 2009

Primeiras notas telegráficas do FMM: Porto Covo

(...que não há tempo para grandes elaborações neste FMM, Frenesi das Músicas do Mundo. Neste preciso momento, por exemplo, está o colectivo numeroso da Orquesta Típica Fernández Fierro em palco.)

O ponto alto destes primeiros dias em que o FMM desce à localidade de Porto Covo foi certamente Dele Sosimi, o nigeriano que transporta a ideia do afrobeat universal (kick race out of music, dizia-me ele há pouco). Esteve radiante perante a imensa plateia -- têm estado muita gente por aqui, contrariando as expectativas pessimistas da crise e da gripe --, aproveitou aqui e ali para comunicar em português (a minha amiga Lúcia tem dedo nisso, já sei também) e pôs quase todos a dançarem sem parar.
Os Ukrainians começaram por parecer uma banda mal ensaiada -- pareciam, aliás, duas bandas: secção rítmica para um lado, restantes músicos para o outro -- mas foram-se encontrando ao longo de um concerto em crescendo. E quando se puseram a tocar temas mais antigos, daqueles que hoje percebo terem de alguma forma ajudado a modelar os meus gostos na música, até arrepios senti. Não houve versões dos Smiths, mas foi tocado o "Anarchy in the UK". Ainda a respeito de ontem, sábado, uma referência ao magnífico guitarrista que acompanhava Victor Demé.
Na sexta-feira, os O'Questrada enfrentaram um palco que ainda não é o habitat deles, mas estiveram em grande forma (se calhar, até já se dão bem com este tipo de palcos). E, diga-se: só o sorriso de Miranda bastava para colorir esta abertura do FMM 09. Depois, no cabaret sofisticado de Rupa & The April Fishes couberam muitas músicas, cantadas em três ou quatro línguas diferentes e os Circo Abusivo continuaram com o ritmo em grandes revoluções, num terreno ora ska, ora surf, ora cigano, ora Manu Chao, ora Gogol Bordello.

(Despachando, que os argentinos estão quase a chegar ao fim, e também do fim se aproxima esta passagem do FMM por Porto Covo. Seguem-se dois dias calmos, com música apenas no Centro de Artes, para depois a coisa começar a crescer de dia para dia, cada vez com mais gente, ora no castelo, ora na praia. Vêm aí a melhor semana do ano.)

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Já falta pouco, parte 5 (uma má e uma boa notícia)

Primeiro, a péssima notícia: a doença obrigou o argentino Ramiro Musotto a cancelar o seu espectáculo.
Em sua substituição, surge o nome de Damily, o guitarrista do Madagáscar que promete rebentar com todos os que forem à praia para o último concerto da noite de quinta-feira, dia 23. Aqui há alguns anos, a compilação "Tulear Never Sleeps" trouxe ao mundo o conhecimento dessa explosiva música do Madagáscar, onde guitarras desenfreadas puxam o mais incauto para a dança. Damily, que vem acompanhado do seu grupo, é um dos expoentes máximos do género. O vídeo seguinte é apenas um cheirinho do que vai ser a madrugada de quinta para sexta:

À vossa atenção

Pensar que a nossa colecção de discos -- ou parte dela, por menor que seja -- pode desaparecer de um momento para o outro é um pesadelo que perturba o sono de todos os que passam música. Aliás, de todos os melómanos. De cada vez que isso acontece a um amigo -- e já têm sido vezes demais -- fico paranóico. Na passada madrugada de sábado, a calamidade abateu-se sobre o Hugo Moutinho, dito Mr. Mitsuhirato nas festas magníficas que tem realizado ao longo dos últimos anos. Justamente depois de uma dessas festas, no Cais do Sodré, foi assaltado. Levaram-lhe dois books de CDs -- um preto, de 240, e um beige, de 80 -- e os headphones (Senheiser brancos). Fica aqui o apelo: quem souber de alguma informação ou encontrar este material à venda (feira da ladra, cash converters, etc.), contacte, por favor, o Hugo: hugomoutinho09@gmail.com.

Já falta pouco, parte 4

domingo, 12 de julho de 2009

Nova edição de Mão Morta



"Rituais Transfigurados" corresponde à gravação do filme-concerto com que os Mão Morta abriram o 16.º Curtas de Vila do Conde, em 5 de Julho de 2008, apresentação única do trabalho de sonorização efectuado na sequência do convite do Festival para os Mão Morta acompanharem musicalmente uma obra cinematográfica, numa produção comissariada por Dario Oliveira, e que recaiu sobre quatro curtas-metragens da realizadora norte-americana Maya Deren, pioneira do cinema experimental.

Alinhamento CD
1. Um Estudo Coreográfico para a Câmara
2. Na Terra
3. Tramas do Entardecer
4. Ritual no Tempo Transfigurado

sábado, 11 de julho de 2009

Já falta pouco, parte 3



A slide guitar pode servir de caminho às ragas indianas? Pode e a resposta tem o nome Debashish Bhattacharya, que vai estar no Castelo de Sines, sexta-feira, dia 24.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Todo o mundo ao CCB!

O programa "CCB Fora de Si" volta a ser grandioso. Na edição deste ano, que decorre entre 16 e 30 de Agosto, vão estar em foco dois continentes, África e Ásia. Entre o rol de artistas agendados, destaque-se a presença de Seun Kuti (filho de Fela Kuti) e Etran Finatawa (Níger). O "CCB Fora de Si" conta ainda, além dos concertos, com oficinas e uma programação de cinema. Mais informações aqui.

Breves de sexta-feira (coisas bonitas que vão acontecer no fim-de-semana)

1. Temos no sábado, por exemplo, os Gala Drop, que fecham, por este Verão, a programação musical do festival Próximo Futuro que a Fundação Gulbenkian está a levar a cabo. Vai ser no belíssimo auditório ao ar livre. Mais informação aqui.

2. No mesmo dia, no Jardim da Estrela, o coreto vai ser okupado. Kumpania Algazarra, Lula Pena, Jorge Ferraz, Guto Pires, Samuel Úria e muitos outros vão estar no jardim entre as 16 e as 24h de sábado. Há um programa detalhado aqui.

3. Ainda no sábado, a ZDB propõe Orquestra VGO (e para a semana, há Telepathe!).

4. Estes dias ficam marcados por mais uma edição de "Uma Casa Portuguesa", na Casa da Música, no Porto. No sábado, há Siba e a Fuloresta (estiveram há poucos dias no MED) e Amélia Muge. Mas há mais (vejam aqui).

5. Também no Norte, e pelas imediações da actual capital do rock'n'roll (Barcelos, para quem ainda não se apercebeu), há mais uma edição do Souto Rock, com The Partisan Seed, Bunnyranch, Mazgani, Black Bombaim, Indignu e Alto!. Mais informação aqui.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Eternal Moonwalk

Finalmente, uma coisa com piada no meio de toda esta histeria:
www.eternalmoonwalk.com
(Obrigado, Laura!)

terça-feira, 7 de julho de 2009

Já falta pouco, parte 2



Dele Sosimi e a sua Afrobeat Orchestra foi assim, no ano passado, no Músicas do Mar, na Póvoa de Varzim (a propósito, o festival não se realiza este ano). O antigo teclista dos Egypt 80, a última banda de suporte de Fela Kuti, vai estar em Porto Covo, a mostrar que todo o groove do afrobeat não tem cor, no primeiro sábado do FMM, 18 de Julho. Antes vão tocar os Ukrainians, os tipos que nos anos 80 faziam versões incríveis dos Smiths para o Ivana Pila, aliás, John Peel, e ainda o guitarrista Victor Demé, do Burkina Faso.

Música actual

Há pouco, passei pelo especial de "informação" que a SIC está a fazer do tributo a Michael Jackson e ouvi alguém dizer que a "música dele continua actual". É verdade, mas fiquei a pensar no que torna actual a música de alguém. Não tenho a resposta, mas estou quase convencido que se deve mais à própria actualidade do que à música de alguém em particular que é objecto de comentários como este. Se a música que se faz hoje em dia, seja por descendência, seja por revivalismo barato, apresenta traços de familiaridade com aquela de alguém, então essa música de alguém será actual, não?

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Já falta pouco, parte 1

Estará Sines preparada para a descarga sonora de L'Enfance Rouge? Vejam o vídeo aqui (não dá para o incorporar nesta página). L'Enfance Rouge, 22 de Julho, já de madrugada, na av. da Praia.

Só pode ser brincadeira

Já não é novidade para ninguém, mas continua a ser difícil de acreditar. Os My Bloody Valentine vão, finalmente, estrear-se ao vivo em Portugal, por ocasião de um novo festival algarvio, que conta, entre outros, com... erm... James Morrison, Gipsy Kings, The Offspring, Fonzie, etc. E parece que ainda estão por confirmar as presenças das Just Girls e dos 4Taste! O festival decorre no Autódromo Internacional do Algarve, em Portimão, de 5 a 8 de Agosto (os MBV fecham a última noite). Bom, ao menos quem já ouviu o barulho ensurdecedor dos carros no autódromo não estranhará tanto a banda do Kevin Shields.

domingo, 5 de julho de 2009

Tout puissant

Totalmente poderosos. A "orquestra folclórica toda poderosa Konono nº1 de Mingiedi" voltou a mostrar por cá por que é cada vez mais famosa, por que é que o Congo está de volta ao mapa da música reconhecida pelo Ocidente, depois do soukous e kwassa kwassa dos anos 80. Já o tinham deixado bem claro em Sines, há três anos, mas na noite de ontem conseguiram ir ainda mais longe, tocar mais fundo nos cérebros e corpos de centenas de pessoas que se entregaram ao baile "congotrónico" por ocasião da festa de aniversário da ZDB nos arruamentos do Museu de História Natural.
Não é fácil descrever este poder "congotrónico", que para sempre ficará associado aos Konono, a quem nunca os viu ao vivo. Há temas que se prolongam e conduzem a estados de autêntico transe, no desenvolvimento dos ritmos minimais produzidos pelo veterano e fundador Mawangu Mingiedi. As mbiras (ou likembés) electrificadas e distorcidas, quando entram, criam momentos de euforia que não encontramos noutras músicas de dança. Dança-se -- mesmo o pé de chumbo mais empedernido -- como se não houvesse amanhã.
Concerto do ano, até ver, e um 10/10 sem espinhas, se isso ajudar a explicar o quão bom foi (e eu a pensar que, depois da epifania com o Neil Young, no ano passado, ia demorar eternidades a voltar a ter uma experiência destas...).

Alguém gravou no telemóvel os primeiros oito minutos do espectáculo (obrigado, Nuno). A qualidade da captação não ajuda, mas ainda assim dá para perceber parte do furor da noite de ontem:

sábado, 4 de julho de 2009

Companheiros

Soaram tão bem ao vivo os novos temas de Tinariwen, ontem, no Forte de São Filipe, no arranque da primeira edição do Arrábida World Music Festival. Em "Imidiwan Afrik Tendam", por exemplo, uma balada perfeita que remete em parte para o título do álbum, "Imidiwan", não é preciso percebermos a linguagem tamasheq em que Ibrahim Ag Alhabib reúne os "companheiros de toda a áfrica" (a tradução do título) para ali vermos uma canção de reencontros à volta de uma fogueira no meio de um oásis, por excelência o ponto de intersecção nos caminhos de tuaregues como os Tinariwen. E isto tem ainda mais piada quando acontece numa imponente fortificação militar com quase cinco séculos, parecido com muitos daqueles castelos, mais antigos, que pelo país fora marcam os outras intersecções que fomos tendo -- por motivos bélicos, é certo -- com os nossos vizinhos muçulmanos. Mas a História levou para longe esses tempos e hoje só nos podemos sentir privilegiados por partilhar reencontros como este.
O Forte de São Filipe é mesmo um dos protagonistas deste festival, que hoje continua com, entre outros, a Sun Ra Arkestra e os Heavy Trash. Parece até que foi desenhado de propósito para um evento como este (ainda que não permita que o festival cresça muito, contudo). O outro palco, por exemplo, num dos pontos mais altos do forte, de onde aliás se captura uma magnífica vista sobre toda a península, colocou literalmente o Paulo Furtado no céu. É uma visão inesquecível a do Legendary Tiger Man iluminado e recortado na noite da Arrábida.
Um festival como este merece continuar (agradece-se é que se arranje outra pessoa para desenhar as luzes do palco principal -- se não há rede suspensa, que se use luzes laterais... ainda hoje vejo sinais vermelhos quando fecho os olhos...)

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Tinariwen, Konono nº1 e muitas outras coisas nos próximos dias

Grandes espectáculos que aí vêm, a começar já hoje, com Tinariwen no Arrábida World Music Festival. O AWM conta ainda com os cabos-verdianos Tcheka e o "nosso" Legendary Tiger Man, hoje, e a lendária Sun Ra Arkestra, amanhã, além do luso-persa Mazgani e os Heavy Trash de Jon Spencer. Vai ser uma curiosa mistura de músicas do mundo com rock'n'roll, bem se vê.

Mas este fim-de-semana fica especialmente marcado pelo regresso dos congoleses Konono nº1. Vão ser os reis da festa do 15º aniversário da ZDB amanhã (e vão também estar no Mestiço da Casa da Música, no dia seguinte), num conjunto de datas que têm início já hoje nas Festas do Almonda, em Torres Novas, um festival que está a passar despercebido injustamente. Afinal, é um festival cheio de nomes interessantes que decorre ao longo de... 10 dias! Além dos Konono, conta com os ciganos indianos Musafir, com a extensa Orquestra Imperial, do Brasil, com os italianos Municipale Balcanica, com os franceses Caravan Palace e, além de outros, com um vasto cartaz de nomes portugueses incluindo Lula Pena, as Tucanas, Cacique 97, Danças Ocultas, etc., e ainda alguns espectáculos mais próximos do teatro. Tudo isto com entrada livre, em dez dias de grande programação que merecem ser lembrados e destacados.

Lisboa acolhe, por sua vez, mais uma edição do Rotas & Rituais no cinema São Jorge, com os Master Musicians of Jajouka (hoje) e Kepa Junkera (amanhã), num ciclo de música que já começou na quinta-feira com os Gaiteiros de Lisboa. Além da música, há ainda programação com teatro, documentários, conferências, ateliers para crianças e exposições no âmbito do tema da "transumância" a que se subordina o festival.

E, pelo Porto, há também o Mestiço, que já começou ontem com Naná Vasconcelos, Virgínia Rodrigues e JP Simões, e que vai ainda levar à Casa da Música, além dos já citados Konono nº1 e Orquestra Imperial, nomes como Babylon Circus, Natiruts, Comunidade Nin-Jitsu, Lei Di Dai, entre outros.

O país (ou uma boa parte dele, sejamos honestos) ferve de acontecimentos.