Embora a guitarra eléctrica não fosse um instrumento comum entre os povos tuaregues, até há bem pouco tempo, já há algumas décadas que se ouve com frequência na música do Mali, do Senegal, das Guinés, dos Camarões, enfim, de toda a África Ocidental. E os blues, afinal, nasceram ali, nas margens do Níger. Mas estes antigos guerrilheiros da libertação tuaregue, contaminados pelas distorções que ouviam nos discos de rock nos campos militares líbios, fazem das suas guitarras autênticas armas, enquanto na sua língua procuram chamar a atenção para a história de opressão vivida por este ancestral povo nómada. Tal é o chamamento dos riffs e das escalas pentatónicas dos Tinariwen que o corpo, na melhor e mais característica qualidade do rock, se deixa levar imediatamente aos primeiros ritmos. Foi o que aconteceu, por exemplo, na noite de ontem, com a plateia do São Jorge Sauna Club a levantar-se logo desde os primeiros instantes e a entregar-se à torrente sónica que subia desde o palco. Nem o calor que a sala ultra-lotada e a inexistência de ar condicionado patrocinavam foi impeditivo para a celebração do maior ritual já alguma vez inventado pelo homem (ah, o "concerto de rock"). As guitarras -- mais uma vez, é impossível fugir ao protagonismo delas --, apesar de apoiadas apenas num pobre djambé e num resistente baixista, mas também elas compensadoras da parte rítmica, foram enredando-se em padrões repetitivos -- não é quase sempre assim a melhor música popular, dos monges budistas aos LCD Soundsystem? -- os quais, como ondas, iam provocando impacto nos corpos e almas em redor. No final, ninguém os queria deixar ir embora e teve que haver um segundo encore, mesmo depois das luzes da sala terem acendido. Inesquecível.
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