sexta-feira, 18 de novembro de 2005

A propósito das cassettes

A propósito do link (ver mais abaixo) para aquele autêntico museu de cassettes e antes que venha daí mais um apelo à nostalgia e "aos bons velhos tempos", acho que é necessário refrear os ânimos e lembrar exactamente o que eram esses tempos da cassette. Inspiro-me numa carta que um leitor da Wire enviou e que foi publicada nesta última edição. A missiva dele vinha justamente responder ao destaque que a revista havia dado, meses antes, a um nostálgico da cassette (já não me recordo se era uma instalação, um livro ou até mesmo uma obra musical editada nesse formato). No meu tempo de adolescente, não era muito o dinheiro que me sobrava da minúscula (mas justa) mesada dos meus pais para comprar discos, fosse em vinilo ou no incipiente CD, pelo que cheguei a acumular para cima de setecentas ou oitocentas cassettes. Daí que me rogo ao direito de ter alguma autoridade para falar do MAU que era o tempo da cassette, por comparação aos dias de hoje. Não tenho essa Wire comigo, neste momento, e repetirei certamente algumas das características que o leitor da Wire enumerou, de uma forma até bastante pungente para quem se famialiriza com essa experiência, e, talvez, acrescentar algumas. Aqui vão elas (quem se lembrar de mais, que acrescente nos comentários):

#1 - Para encontrar a faixa que queríamos, era um pesadelo. Alguns leitores mais inteligentes da última geração vinham já acompanhados de um sistema que identificava as pausas, mas, ainda assim, éramos obrigados a esperar que a fita corresse até ao sítio certo. Que perda de tempo.

#2 - No tempo dos álbuns em vinilo, a duração das cassettes de 90 minutos até possibilitava a gravação de um disco em cada um dos lados, mas quando chegaram os CDs e a duração padrão dos 70 minutos, veio a dor de cabeça de ficar com álbuns cortados entre um lado e outro. Por vezes, a última canção do lado A ficava mesmo cortada, levando-nos posteriormente a irritantes coitus interruptus quando a fossemos ouvir por engano e, de repente, naquele momento empolgante, zás, acaba a fita. Uma gestão mais cuidada do espaço durante a gravação podia evitar este problema, é certo, mas as cassettes nem sempre tinham a mesma duração. Mais ainda: o que fazer com o espaço livre no lado B? A opção, por estes lados, era a de gravar singles, de preferência ligados a esse mesmo álbum, mas nem sempre era fácil fazer essa ligação óbvia. Estas dúvidas chegavam a ser existenciais.

#3 - As cassettes tinham a porra da mania de se gastarem com o tempo. Quantas versões diferentes não tive eu de gravar do primeiro álbum dos Mão Morta ou do "It's Alive" dos Ramones? Desesperante.

#4 - Havia também uma característica que se evidenciava particularmente com o tempo e com o uso dado à cassette que era a alteração drástica que os primeiros minutos da fita sofriam ao nível da equalização sonora. No início da fita, perduravam apenas as frequências graves, como que se durante a primeira faixa, os músicos estivessem a tocar dentro de um aquário. Era assustador.

#5 - Para quem ouvia muita música, havia a garantia que tinha de tomar uma de duas opções: ou renovava o material onde ouvia as cassettes ou tinha que constantemente andar a afinar o parafuso que comandava a cabeça de leitura, com uma chave de fendas minúscula, sem nunca ter a certeza de estar a fazer a afinação mais apurada. De loucos.

#6 - Quantas fitas não ficaram irremediavelmente trituradas no mecanismo do leitor de cassettes? E se por acaso não estávamos lá quando isso acontecia? Apetecia-nos atirar com o leitor à parede.

Continuem, por favor, que eu já estou retro-deprimido...

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